No último mês de novembro, o Sincopeças do Rio Grande do Sul se reuniu com o deputado federal Maurício Marcon (PODE-RS), relator do Projeto de Lei que aumenta a penalização pela venda de autopeças falsas (PL 5258/2020), para entregar dados levantados pelo sindicato sobre o atual cenário de falsificação de componentes no aftermarket e expressar a importância da pauta para o setor.
O encontro veio na esteira de um longo engajamento do Sincopeças-RS com a pauta, engajamento este que, na metade do ano, resultou em relatório que mensurou o prejuízo causado por fraudes como falsificação, sonegação, contrabando e concorrência desleal para a cadeia de autopeças brasileira, na casa dos R$ 16 bilhões anuais. Vale pontuar que, de acordo com a legislação atual, a pena para tais fraudes é de prisão de 1 a 5 anos e multa. Para entender mais sobre os estudos da entidade, bem como as expectativas da tramitação do projeto no Congresso Nacional ao longo do próximo ano, conversamos com exclusividade com o presidente do sindicato que representa os varejistas de autopeças gaúchos, Marco Antônio Vieira Machado.
Novo Varejo – Recentemente, o Sincopeças-RS produziu um relatório sobre os dados de pirataria no mercado de autopeças do Brasil. Quais foram os principais achados deste documento?
Marco Antônio Vieira Machado – Pirataria e falsificação de autopeças estão sendo o tema de campanha idealizada pelo Sincopeças-RS. Acreditamos que o trabalho de combate a este mecanismo deva ser constante, justamente por ser um “câncer” no meio automotivo – e não só no meio automotivo: o conteúdo divulgado aponta prejuízo de R$ 414 bilhões em arrecadação tributária e faturamento das indústrias brasileiras (de todos os gêneros) legalmente estabelecidas, relacionado à falsificação, contrabando e pirataria; e que o setor de autopeças é o 7° mais prejudicado no ranking, ficando atrás dos nichos de bebidas, combustível, vestuário, defensivos agrícolas, sementes agrícolas e perfumaria. O prejuízo é de R$ 16 bilhões anuais para as autopeças. Os dados são referentes ao período de janeiro de 2023 a janeiro de 2024.
Novo Varejo – Quais são os elos da cadeia mais prejudicados: varejo, distribuição, indústria ou reparação?
Marco Antônio Vieira Machado – É um efeito cascata. Começa na base, que a é a fabricação e importação de peça falsificada ou pirateada, prejudicando a arrecadação das empresas que atuam de forma idônea; e, assim, sucessivamente atingindo a distribuição e varejo chegando no reparador. Todos são afetados pela informalidade, não esquecendo do consumidor final, que não terá um serviço automotivo à altura e ainda correrá o risco de uma fatalidade pelo uso de peças duvidosa
Novo Varejo – Em quais fontes vocês se apoiaram para a construção desse material? Vemos que, em geral, o mercado sabe que sofre com peças falsificadas, mas ainda tem dificuldade de mapear a magnitude e funcionamento dessa contravenção.
Marco Antônio Vieira Machado – Todo o conteúdo sobre pirataria e falsificação elaborado pelo Sincopeças-RS foi baseado em dados do Anuário 2024 – Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF), que traz informações sobre os prejuízos, setores mais afetados, número de apreensões registradas com o apoio da entidade e destino final dos criminosos, entre outros dados. Além do CNCP – Conselho Nacional de Combate à Pirataria e o Observatórios de Mercados Ilícitos da FIESP.
Novo Varejo – Por falar em funcionamento, você conseguiria descrever como é a ‘rota da falsificação’ de autopeças no Brasil? Sobretudo em dois pontos: onde as peças são fabricadas majoritariamente e onde elas são comercializadas?
Marco Antônio Vieira Machado – Conforme o Anuário 2024 – Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF), estima-se que 65% dos produtos falsificados à venda em território brasileiro são provenientes da Ásia, especialmente China. O restante é confeccionado dentro do Brasil, além do Paraguai. São Paulo, principal mercado consumidor do país, é o destino preferido dos bandidos. Em seguida, na lista, Paraná, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Goiás, Pará e Rio de Janeiro. Estes são os maiores mercados afetados pela falsificação e contrabando de produtos industrializados, representando R$ 402 bilhões por ano.
Novo Varejo – Você acredita que os reparadores e os próprios varejistas do país estão, na maior parte das vezes, preparados para reconhecer uma peça falsificada? Quando eles reconhecem, se recusam a aplicá-la ou, em alguns casos, são coniventes com a situação, buscando aumentar suas margens?
Marco Antônio Vieira Machado – Há várias maneiras de identificar uma peça falsificada ou pirata e acreditamos que a grande maioria dos lojistas e reparadores saiba a reconhecer e se recusa a usar, pois como eles mesmos dizem, “o barato sai caro”, visto que o serviço não ficará a altura e, possivelmente, o veículo voltará para a oficina com ainda mais problemas causados por uma peça sem procedência. É prejuízo para o consumidor e para a oficina, que, além de tudo, fica com sua imagem manchada. As diferenças parecem sutis, mas com o manuseio diário fica fácil identificar observando detalhes, nas borrachas, por exemplo: as peças originais geralmente são foscas, sem brilho, são mais robustas, reforçadas e com bom acabamento. Na parte metálica também pode-se perceber que não há avarias, tornando os encaixes perfeitos. Primeiro passo para identificar uma peça original inicia em avaliar a embalagem, selos de qualidade e, na peça, a marcação da numeração ou marca da procedência e aplicação.
Novo Varejo – Qual seria a forma mais eficiente de combater a pirataria no âmbito das autopeças?
Marco Antônio Vieira Machado – É um trabalho contínuo, pois sempre haverá quem se disponha ao crime, buscando pelo dinheiro fácil. É preciso conscientizar a população (por meio de campanhas partindo do governo, entidades de classe e do próprio setor), investimento em agentes e equipamentos, aliar tecnologia às ações de fiscalização e inteligência (principalmente em portos e fronteiras, que são as portas de entrada de 60% dos produtos piratas vendidos no país) e, também, penalidades mais severas.
Novo Varejo – Como você tem visto o engajamento do poder público neste combate? O PL 5258/2020 tem sido tratado com a devida urgência pelos parlamentares do Congresso?
Marco Antônio Vieira Machado – O Projeto de Lei 5258/2020 altera o art. 175 do DecretoLei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para incluir a nova causa de aumento de pena. Conforme a legislação atual, é crime enganar, no exercício de atividade comercial, o adquirente ou consumidor vendendo, como verdadeira ou perfeita, mercadoria falsificada ou deteriorada ou entregando uma mercadoria por outra, sob pena de detenção de seis meses a dois anos, ou multa. A proposição é de autoria do deputado federal Lincoln Portela (PL/MG) e foi apresentada em 25 de novembro de 2020. No momento, o PL está na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC) tendo como relator o deputado federal Mauricio Marcon (PODE-RS). Foi o Sincopeças-RS que alertou a Fecomércio-RS da existência deste projeto. Uma comitiva da Federação recentemente visitou o Deputado Marcon. Na oportunidade foi discutido o andamento do PL, sua importância ao combate destes crimes, inclusive com a possibilidade da ampliação do rol de produtos e mercados a serem protegidos. O fato de que a venda de peças falsas tem relação direta na acidentalidade e mortes no trânsito (dados levados pelo Sincopeças-RS) justificam o andamento do PL 5258.
Novo Varejo – Além do Sincopeças-RS, existem outras entidades representantes do aftermarket engajadas na atuação junto ao poder público para mitigar o problema da falsificação de autopeças no país?
Marco Antônio Vieira Machado – O tema recentemente foi levado pelo Sincopeças-RS à Câmara Brasileira do Comércio de Peças e Acessórios para Veículos – CBCPAVE. O engajamento de todos é fundamental para alertar a população dos riscos envolvidos com a compra e utilização de peças falsas.