Popularização das impressoras 3D não impacta segurança do Aftermarket Automotivo -

Popularização das impressoras 3D não impacta segurança do Aftermarket Automotivo

Especialista destaca que utilização desses equipamentos ainda não chegou às peças estruturais, mas avança em diferentes outras aplicações

A impressão 3D tem ganhado espaço na indústria automotiva já há algum tempo. Nos últimos anos, porém, ela está saindo das montadoras para chegar ao segmento da reposição, despontando como uma solução promissora para a fabricação de peças em pequena escala e a personalização de componentes.

Embora o tema ainda esteja em estágio inicial no Brasil, já é possível perceber avanços significativos, sobretudo no uso da tecnologia para a produção de peças plásticas não estruturais. Esses componentes, que não têm relação direta com a segurança veicular — como emblemas, manoplas, suportes e acabamentos internos — vêm sendo cada vez mais fabricadas com impressoras 3D acessíveis.

Segundo o Diretor de Manufatura e Materiais da Associação Brasileira de Engenharia Automotiva (AEA), Carlos Sakuramoto, essa mudança está sendo impulsionada pela queda no custo dos equipamentos e pela ampliação das possibilidades de uso em ambientes industriais fora dos grandes centros de engenharia.

Por outro lado, a aplicação da impressão 3D em peças estruturais ou ligadas ao desempenho e à segurança do veículo ainda encontra barreiras importantes. Componentes como suportes metálicos, itens da suspensão, partes do motor e da transmissão requerem materiais e processos de fabricação mais sofisticados, que ainda não estão amplamente disponíveis no mercado automotivo brasileiro.

“Não vou dizer que não há nenhuma empresa que use, tá? Mas é muito mais raro e, em geral, está restrito às grandes montadoras”, afirma Sakuramoto, complementando que, para ele, ainda há um caminho longo até que essas aplicações se tornem viáveis em escala – a despeito das diversas pesquisas envolvendo o tema ao redor do mundo.

As limitações técnicas são acompanhadas por desafios econômicos. “O ferramental de uma injeção de alumínio ou de aço ainda é muito caro”, observa. Ainda que os ganhos de médio prazo sejam significativos — como a eliminação de estoques obsoletos e a produção sob demanda —, a viabilidade atual é maior para itens com menor complexidade técnica e risco de falhas.

Sakuramoto também tranquiliza o mercado ao apontar que o estágio atual da impressão 3D automotiva ainda não exige uma regulação específica ou uma preocupação imediata com riscos associados a seu uso indiscriminado. Segundo ele, todas as lacunas mencionadas freiam qualquer iniciativa de impressão de peças estruturais sem que haja o controle de qualidade e a fiscalização adequada.

Para entender mais estes e outros assuntos ligados ao avanço das impressões 3D, cujas implicações podem mudar o jogo do Aftermarket Automotivo no futuro, conversamos com exclusividade com o especialista da AEA.

Novo Varejo Falando da indústria automotiva como um todo, o quanto as impressoras 3D para impressão de peças automotivas já estão presentes nas empresas?
Carlos Sakuramoto
– Quando falamos de peças não estruturais, esse uso já está bem adiantado. Afinal, o custo dessas impressoras está caindo e algumas delas podem até mesmo ser compradas no Mercado Livre. Essa parte já está bem acessível até para empresas de menor porte, inclusive.

Novo Varejo – A que você se refere especificamente quando falamos de peças estruturais?
Carlos Sakuramoto – Falo das peças que tenham relação com o funcionamento do veículo e sua segurança. Por exemplo, atualmente, as impressoras 3D praticamente não são utilizadas para componentes do motor, da transmissão ou algo do tipo. Não vou dizer que não há nenhuma empresa que use, tá? Mas é muito mais raro e, em geral, está restrito às grandes montadoras.

Novo VarejoVocê falou sobre o barateamento das impressoras 3D. É possível que esse movimento continue acelerando até um ponto em que teremos de ter uma fiscalização sobre o uso desses equipamentos para imprimir componentes ligados à segurança do veículo sem autorização?

Carlos Sakuramoto – Olha, eventualmente penso que devemos ter essa preocupação sim. Até porque, a relação das autopeças metálicas e estruturais do veículo com sua segurança é uma coisa muito séria. Mas, olhando o cenário atual, penso que esse é um problema que vai demorar para aparecer. Afinal, ainda existem gaps na área de tecnologia e até de capacitação em relação a esse uso. Fora isso, há a questão do preço. É claro que a pesquisa se desenvolve muito rápido e existem vários projetos de pesquisa no mundo inteiro tentando viabilizar o uso das impressoras 3D para as autopeças de reposição, mas ainda vai demorar um tempo até que isso se torne uma preocupação real.

Novo VarejoIsso vale tanto para o mercado brasileiro quanto para o internacional?
Carlos Sakuramoto – Sim, para ambos. O ferramental de uma injeção de alumínio ou de aço ainda é muito caro. É claro que a pesquisa se desenvolve muito rápido e existem vários projetos de pesquisa no mundo inteiro tentando viabilizar o uso das impressoras 3D para as autopeças de reposição. Afinal, isso reduziria muito o custo, né? Mas estamos em um estágio do processo que, pelo meu conhecimento, ainda está bastante longe de gerar uma preocupação real.

Novo Varejo Em que casos, então, a impressão 3D já faz mais sentido hoje na reposição?
Carlos Sakuramoto
– Emblema de veículo, por exemplo. Não tem relação com segurança. A bolinha do câmbio também, muitos já vêm personalizando. Então há esses itens que não têm relação com segurança e já devem estar sendo utilizados. O mercado de reposição não tem uma escala muito grande. Então, se você tiver que manter um ferramental para a injeção de plástico para uma demanda muito pequena, isso é caro. Agora, uma impressão 3D de plástico de baixo custo já cabe muito bem.

Mercado em expansão

O mercado de impressão 3D é extremamente promissor e os números acompanham as expectativas. Nos Estados Unidos, deve evoluir de US$ 6,52 bilhões estimados em 2025 para US$ 24,79 bilhões até 2034, o que representa taxa de crescimento anual composta (CAGR) de 16,0% no período. Globalmente, o volume total é estimado em US$ 105,9 bilhões até 2030, com CAGR de 24,9% até lá. No Brasil, faltam estatísticas confiáveis, mas é fato que a tendência também é de expansão e o surgimento de novos modelos de negócios.

O setor automotivo mostra ritmo de crescimento, impulsionado por demandas de personalização dos veículos. É um mercado que evolui à CAGR de 14,2%, tendo sido estimado em US$ 4,7 bilhões em 2023. A tecnologia permite rápida e econômica criação de protótipos, customizando componentes com precisão. Outro benefício é a adequação às exigências cada vez maiores de sustentabilidade – itens mais leves, uso otimizado de materiais, entre outros ganhos.

Embora, como vimos na entrevista, as aplicações ainda estejam restritas a determinados componentes, as possibilidades futuras parecem promissoras. No final do ano passado, por exemplo, a empresa especializada 3Dnatives apresentou um novo carro conceito desenvolvido com tecnologia de impressão 3D para demonstrar o imenso leque de personalização interna e externa a partir do gosto de cada consumidor.

Saindo do conceito para a prática, a impressão 3D vem ganhando espaço entre as montadoras. Um exemplo que merece ser citado é a BMW, que já soma mais de 30 anos de experiência em manufatura aditiva – a marca alemã utiliza impressoras 3D desde 1991 para produzir peças e componentes individuais de veículos, inicialmente para carros-conceito, protótipos e carros de corrida, e mais tarde também para modelos de produção.

Além do processo direto de manufatura aditiva, o BMW Group também utiliza há anos a impressão 3D baseada em areia para criar moldes. A tecnologia é usada para fabricar protótipos, assim como para produção em larga escala de componentes para motores de alto desempenho. Um exemplo são os moldes para fabricação de cabeçotes de cilindro em alumínio, impressos tridimensionalmente pelo processo de fundição em areia. Nesse processo, camadas finas de areia são aplicadas e unidas com ligantes, permitindo criar moldes para estruturas extremamente complexas, que depois são preenchidas com alumínio líquido.

E mais: o Centro de Tecnologia e Construção Leve em Landshut, na Alemanha, utiliza um grande elemento de garra fabricado por impressão 3D. Pesando cerca de 120 kg, essa garra robótica pode ser produzida em apenas 22 horas e é usada em uma prensa na fabricação de todos os tetos CFRP dos modelos BMW M. A garra carrega o material bruto na prensa e depois gira 180° para retirar os tetos prontos. Comparada com garras convencionais, a versão impressa em 3D é cerca de 25% mais leve, o que prolonga a vida útil dos robôs, reduz o desgaste do sistema e diminui os intervalos de manutenção. As garras produzidas por impressão 3D também são usadas na montagem de chassis

O desenvolvimento de materiais resistentes e de alto desempenho tem contribuído para o rápido avanço da indústria global de impressão de componentes automotivos em 3D. Compósitos reforçados com fibra de carbono, titânio e ligas de alumínio cada vez mais atenderão à busca das montadoras por peças com maior resistência, durabilidade e desempenho, tornando viável em algum momento a produção de componentes críticos, como partes estruturais, peças de motor e ferramentas personalizadas.


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