Varejo nos EUA: Fechamento de lojas é alerta para o Brasil

‘Apocalipse’ do varejo nos EUA é sinal de alerta para empresas brasileiras

Muitos varejistas no Estados Unidos estão fechando suas portas por não se reinventarem ao longo dos anos.
Varejo nos EUA: Lojas que não se modernizaram estão fechando por não se adequarem.
Por Lucas Torres

Os últimos anos têm sido de melhora para índices importantes na economia dos Estados Unidos. Em 2019, a taxa de desemprego do país atingiu uma baixa histórica de 3,5%, a menor desde novembro de 1969. Junto com o emprego, a renda média do país tem crescido substancialmente ao longo dos últimos quatro anos, atingindo um rendimento médio domiciliar de US$ 63.179 anuais.

Com renda e emprego saudáveis, a equação positiva tem culminado em fortes avanços no varejo dos Estados Unidos – avanços estes expressos no fato de o setor ter alcançado a melhor marca de arrecadação em toda sua história no acumulado do ano 2019, quando atingiu o montante de 5 trilhões de dólares. Todos esses índices macroeconômicos tenderiam a nos fazer pensar que o ambiente para o varejista no país se aproxima de um oásis de prosperidade em meio à instabilidade internacional.

Na prática, no entanto, algumas particularidades do setor fizeram com que a expressão ‘Apocalipse do Varejo’ fosse utilizada com frequência durante a NRF 2020. Dados trazidos por Eduardo Yamashita durante o Retail Trends apontaram que, no ano passado, o setor fechou 7.567 lojas contra a abertura de apenas 3.064. “Empresas tradicionais que não se reinventaram ao longo dos anos estão enfrentando graves dificuldades para sobreviver diante da pressão imposta pelas tendências globais. Muitas das que admirávamos estão fechando portas ou pedindo concordata”, pontuou o COO do GS& Gouvêa de Souza.

De acordo com o especialista, essa pressão que funciona como uma espécie de ‘ponto determinante de uma curva adaptativa’ e, como na Lei de Darwin, cresce de forma diretamente proporcional ao aumento da permeabilidade do setor ao ambiente digital.

Yamashita afirma que esse ‘grito pela necessidade de mudança’ se torna decisivo a partir do momento em que a penetração digital chega a 15%.

“No Brasil, essa penetração é de 3,3% atualmente (2% no varejo automotivo) e a projeção é que em 10 anos esse índice avance para 11,4%. Ou seja, estamos próximos de passar por essa transformação – ou ‘apocalipse’ – internamente”, projeta Yamashita.

Conjecturando sobre o que separa uma empresa adaptada à era digital para uma que se tornará um ‘dinossauro analógico’, o executivo aponta que em 10 anos existirão 3 tipos de empresa:

1 – Aquela que não se reinventou e morreu.

2 – Aquela que se reinventou ao compreender a premissa primordial de ter o canal de comunicação com o consumidor como principal ativo.

3 – Aquelas que jogam um jogo diferente ao não apresentarem fronteiras entre o físico e o digital e que têm na retirada da fricção entre a vontade do consumidor e o serviço oferecido um valor indissolúvel – caso da Amazon.

“Como exemplo de empresa tradicional que têm se reinventado para esse ambiente ‘fígital’ – isto é, em que não há fronteiras entre o físico e o digital – há o Wall Mart, empresa que tem usado suas 4.800 lojas físicas nos Estados Unidos para ganhar a guerra no digital”, pontuou Yamashita, antes de complementar:

“Hoje, 80% das lojas da empresa no país têm ‘pickup’ (quando o cliente compra no digital e retira na loja física) e mais de 30% já fazem a entrega grátis no mesmo , para compras acima de US$ 35,00”.

Entre os dias 12 e 14 de janeiro, a Federação Nacional de Varejo dos Estados Unidos promoveu mais uma edição da NRF, a maior feira do setor no planeta, realizada anualmente na cidade de Nova Iorque.

Reunindo algumas das principais personalidades ligadas ao comércio, o evento tem como objetivo discutir casos emblemáticos e disruptivos a fim de, a partir deles, apontar as tendências do chamado ‘varejo do futuro’. Essa abordagem, no entanto, fez com que no decorrer dos anos – com o avanço de tecnologias como robótica, realidade virtual e inteligência artificial – a NRF acabasse sendo rodeada por uma série de ‘shows de pirotecnia’, característica que, em determinadas edições, desviou o foco daquilo que o evento traz de realmente substancial.

Na edição 2020, nem mesmo os mais deslumbrados com o aparato tecnológico ignoraram o fato de que a NRF foi, mais do que nunca, ‘demasiada humana’, não apenas por relembrar aos participantes de que toda a tecnologia do setor deve servir como meio de colocar o consumidor no centro, mas por evidenciar alguns dos conflitos políticos que permeiam a conjuntura global.

Nesse contexto, a guerra comercial entre Estados Unidos e China desempenhou papel de protagonismo, alterando totalmente a configuração do evento em relação à sua edição de 2019, quando gigantes do varejo do país asiático como o Alibaba tiveram enorme destaque.

Em 2020, a comitiva chinesa foi reduzida a apenas dois entre os mais de 400 palestrantes presentes na NRF, dinâmica que, diante da relevância das empresas asiáticas – continente que conta com 210 das 500 principais empresas do mundo e que tem a China como principal propulsora – só pode ser explicada pelo jogo político.

Tal peculiaridade da edição 2020 foi criticada pelo COO do Grupo GS& Gouvêa de Souza, Eduardo Yamashita, durante o encontro ‘Retail Trends Pós NRF’ promovido pelo grupo no último dia 6 de fevereiro, na cidade de São Paulo. De acordo com Yamashita, fechar os olhos para o mercado asiático é atitude irresponsável diante das características ‘early adopter’ e do alto nível de tecnologia e pesquisa desse mercado, ambiente que invariavelmente produz tendências e caminhos para mercados ao redor do mundo.


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