Por Lucas Torres
A nova epidemia do Coronavírus já começa a afetar a importação de autopeças produzidas na China para o mercado de reposição brasileiro. Importadores ouvidos pela reportagem do Novo Varejo dizem que os preços vêm aumentando e temem, também, que possa haver desabastecimento pontual de alguns itens. Embora os desdobramentos do crise de saúde no país asiático ainda sejam desconhecidos, o problema já ligou o sinal de alerta no mercado brasileiro.
Além da trágica perda de vidas, o coronavírus tem provocado instabilidade na economia mundial pelo fato de estar afetando a capacidade produtiva da indústria chinesa. E o setor automotivo tem sido um dos principais atingidos já que Wuhan representa um polo essencial na produção de autopeças do gigante asiático, que lidera o ranking mundial de exportações desses produtos. “Conforme dados da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (Secex), em 2019, a China ocupou o primeiro lugar na origem das importações de autopeças, com US$ 1,7 bilhão, quase 15% do total importado”, informa Dan Ioschpe, presidente do Sindipeças. Apesar da paralisação industrial de Wuhan, Ioschpe diz que até o momento não há indicação de problemas de suprimento, acrescentando que a ocorrência ou não dependerá do tempo de retomada das atividades.
O professor da Associação Brasileira de Consultoria e Assessoria em Comércio Exterior (Abracomex), João Marcos Andrade, acrescenta que as chances do atual cenário de paralização na China ocasionar um impacto prático no abastecimento de países que dependem de sua produção industrial são pequenas. Segundo ele, a análise de um contexto histórico indica que as recuperações de produtividade em curto espaço de tempo são sólidas e convincentes a ponto de não gerar um desconforto em grande escala às empresas dependentes do fornecimento de seus insumos ou produtos chineses. “O mercado chinês está tão bem consolidado em suas estruturas de produção – bem como sua capacidade de fazer ajustes, adaptações, revisões de processos e adequações a situações de crises é tão bem administrada – que por mais grave que possa ser a situação, ainda não observamos ao longo dos últimos 20 anos uma circunstância que causasse impacto tão negativo no recebimento de produtos vindos daquela origem a ponto de demandar novos desenvolvimentos de fornecedores em outros países e regiões”.
Apesar da abordagem sóbria diante do cenário atual, João Marcos Andrade salienta que não é aconselhável que as empresas brasileiras ignorem as chances, embora remotas, de passarem a conviver com uma escassez de produtos que possam abastecer linhas de produção ou as prateleiras de vendas de autopeças no curto-prazo.
“Em primeira necessidade a excelente condição de produção da China nos deixa tranquilos. Mas, ao mesmo tempo, não podemos condicionar nosso futuro a qualquer possível situação de falha no fornecimento de produtos de nosso maior parceiro para fornecimento de insumos e produtos manufaturados e semimanufaturados”.
Questionado sobre a capacidade adaptativa das empresas brasileiras em caso de intensificação da crise, Dan Ioschpe aponta que é muito difícil fazer uma análise generalizada da situação, pois ela depende do grau de negócios que cada uma delas possui com o país asiático. Ele compartilha, porém, que nesse momento é possível que algumas empresas já estejam se preparando em busca de alternativas.
Epidemia impulsiona alta do dólar
O coronavírus já tem produzido efeitos na economia. Se no início do ano, o Banco Central afirmou que as seguidas altas do dólar ao longo de dezembro do ano passado seriam amenizadas em 2020 por um cenário de maior estabilidade externa, hoje as previsões se tornaram incertas diante de uma instabilidade global que faz com que a moeda dos Estados Unidos ultrapassasse os R$ 4,30 em fevereiro.
“A volatilidade do câmbio no Brasil, assim como na grande maioria das nações praticantes da economia de mercado, depende muito do cenário externo. Os países sob suspeita de crise sempre sentem efeitos muito rápidos em suas economias.
Isso tudo demanda revisões de políticas de governo para atender primeiramente a indústria nacional e, no caso do Brasil, muito fortemente o setor agropecuário, sobretudo nas exportações, realidade que permite a concepção de que não teremos, pelo menos antes do final do primeiro semestre, uma perspectiva de redução da cotação da moeda americana abaixo de R$ 4,00, pois o cenário econômico mundial pode levar certo tempo para recuperar os efeitos do coronavírus. É possível considerar que a cotação do dólar não será reduzida tão cedo. Pelo contrário, devemos estar prontos para conviver com as constantes variações, até porque 2020 é ano de eleições nos Estados Unidos, que também impactam a economia mundial”, finaliza ”, João Marcos Andrade.