Design Thinking adapta empresas às constantes mudanças na demanda dos consumidores -

Design Thinking adapta empresas às constantes mudanças na demanda dos consumidores

Febre nos EUA, metodologia propõe modo de pensar contínuo e que se direciona à percepção, sistematização e solução de problemas que geram incômodos nos clientes

 

Por Lucas Torres ([email protected])

Ao perceber a direção a que as cada vez mais velozes mudanças tecnológicas levavam a nossa sociedade ainda no século passado, o canadense Marshall McLuhan popularizou a tese de que ‘O meio é a mensagem’.

Em suas análises, o filósofo e teórico da comunicação apontava para o fato de que os novos meios de comunicação não apenas serviam como transmissores de mensagens, mas alteravam a dinâmica de quais mensagens se tornariam importantes a partir dali, por quanto tempo elas seriam relevantes e como elas seriam recebidas pela população em geral. Em suma, ele percebeu que os avanços tecnológicos impactavam a forma como a sociedade em si se organizava.

Trinta e oito anos depois da morte de McLuhan, vivemos em uma sociedade na qual mensagens podem ser enviadas instantaneamente. E podem ser corrigidas instantaneamente. E, no caso do Whatsapp – um dos aplicativos mais populares no âmbito da comunicação pessoal e corporativa –, podem ser apagadas após o envio sem que o receptor tenha tido a oportunidade de vê-las.

Tal como observou o teórico, essa ‘instantaneidade comunicacional’ propiciada pelos meios tecnológicos produziu enorme impacto social e invadiu, dentre tantos outros, o ambiente dos negócios, sobretudo pela mudança gerada no comportamento do consumidor.

Da mesma maneira que o cidadão disse algo há segundos que agora não quer dizer mais e apaga a mensagem de seu wpp, ele, enquanto consumidor, queria algo em fevereiro e em março não quer mais e se vai querer em abril ninguém sabe…

Diante disso, empresas que antes eram acostumadas a sentar em novembro ou dezembro para fazer o famoso ‘planejamento anual’ passaram a ter de se planejar e se modificar constantemente em um calendário mensal, quinzenal e até semanal.

Atento a este cenário, o Laboratório de Inovação do Varejo (ProVA) iniciou em outubro passado oficinas sobre a aplicação da metodologia do ‘Design Thinking’ (DT) para empresas varejistas.

A ideia é que os empresários do setor comecem a se familiarizar com um modo de pensar contínuo e que se direciona à percepção, sistematização e solução de problemas que geram incômodos nos clientes e prejudicam suas experiências como consumidores.

O DT se encaixa à exigência com que as coisas se modificam nos dias atuais, por primar pela constante geração de ideias e rápida aplicação. “Caso as ideias não sejam viáveis, elas são imediatamente substituídas por novas soluções. O lema é simples: errar cedo para corrigir cedo”, analisa Paulo Capucho, mestre em Design, Tecnologia e Inovação.

Além da característica de ‘organismo vivo’, o DT absorve ainda outra característica bastante presente na sociedade contemporânea e nas empresas de sucesso: a fluidez das áreas do pensamento e a interdependência entre setores.

Doutor em Engenharia, designer e especialista no tema, Nelson Tavares afirma que o pensamento divergente e a multidisciplinaridade incentivada pelo DT permitem a geração de diversas alternativas à realidade identificada.

A partir daí, segundo Tavares, a metodologia busca convergir as múltiplas alternativas apresentadas a fim de que se tome a decisão sobre a melhor solução. “A última fase é a de análise e síntese, que permite romper com os padrões e a síntese identifica os padrões significativos e os rearranja”, completa.

Apesar de parecer complicado e tecnológico demais à primeira vista, o DT segue um padrão intuitivo, voltado totalmente para diferentes percepções humanas da realidade em prol de solucionar questões igualmente humanas. É mudar o foco de ‘fazer as pessoas quererem algo’ para ‘fazer algo que as pessoas querem’, atendendo demandas em tempo real.

O processo é basicamente: olhar fundo para as necessidades dos clientes, colocando-os em primeiro plano; sentar com as diversas áreas da empresa no caso de varejos pequenos, da diretoria ao balconista, para reunir a maior diversidade de pontos de vista possível; testar e aplicar as soluções geradas.

 

Design Thinking surgiu nos Estados Unidos como solução para o ‘quadradismo’ administrativo 

Tal como abordado no início do texto, o pensamento e o comportamento humano tendem a acompanhar as mudanças tecnológicas, sobretudo as de âmbito comunicacional.

No início dos anos 2000, em pleno ‘boom’ da internet, empresas dos Estados Unidos começaram a perceber que profissionais da administração – embora altamente capacitados com cursos de MBA e doutorado – não supriam uma demanda cada vez mais latente em seus cotidianos: a inovação.

Pensando nisso, um grupo de pensadores da Universidade de Stanford passou a planejar soluções que acrescentassem o pensamento orgânico, flexível e altamente sustentável do design ao tecnicismo e à eficiência gerencial das companhias.

“A ideia do Design Thinking é primordialmente juntar as duas coisas. Utilizar a flexibilidade e a humanização do pensamento do designer para tirar a rigidez dos processos das empresas que, muitas vezes, bloqueavam a inovação, cada vez mais demandada pela sociedade”, afirmou a norte-americana Diana Scates, pesquisadora de DT e cofundadora do RJM Institute e Creator.

Diana conta que a disseminação do DT como impulsionador à inovação é tamanha nos Estados Unidos que existe um processo de proliferação de cursos universitários e de especialização voltados para a metodologia.

“Hoje existe uma demanda para o DT nas mais diversas áreas da nossa economia. Desde saúde, até a indústria de eventos, passando pela gestão de negócios…”, conta a especialista. “A inserção do DT na operação das empresas é tamanha que companhias de alto calibre como a Pepsi e a 3M já introduziram em seus organogramas o cargo de Chief Design Officer (CDO) – profissional especializado em implementar a inovação por meio das ferramentas e do pensamento do designer nessas empresas”, finaliza Diana Scates.

 

Conceito também se aplica ao pequeno varejo de autopeças

Com base em um suposto perfil conservador do varejo de autopeças no Brasil, é comum que se diga que avançadas ferramentas de gestão não cabem nesse segmento. Entrevista deste mês pelo Novo Varejo, a especialista em Gestão Estratégica e Tecnológica Suzana Leonardi discorda deste pensamento reducionista ao avaliar a pertinência do design thinking para os estabelecimentos de comércio de componentes automotivos no mercado de reposição. “O DT cabe em qualquer atividade, inclusive na nossa vida pessoal. O importante é entender que, mais do que uma metodologia, trata-se de um modo de pensar. A mentalidade hoje do mundo moderno é voltada para a inovação, exatamente para a mudança. Qual é o modelo mental? Por que a gente fala design thinking? Nada mais é do que pensar com design”, diz a especialista, que traça um paralelo para ilustrar o conceito. “Quando um designer vai criar uma cadeira, qual é a primeira coisa que ele pensa? É saber que ela vai ser utilizada. Que problema ela tem de atender? É para ficar sentado o dia inteiro, em um escritório, é para sentar no jantar? O designer começa não pela solução, mas para entender o problema profundamente. Qual o problema que está por trás que esse produto a ser criado precisa resolver e que os produtos já existentes não conseguem?”

Suzana explica que, o passo seguinte, é entender o consumidor. “Quem vai usar a cadeira? O que incomoda esse consumidor hoje? A partir disso, como essa cadeira pode ajudar? Aí eu só começo a pensar em novas ideias depois que todos essas questões foram trabalhadas. Com certeza, ao final, eu terei uma ideia muito diferente da que eu tinha antes de iniciar o processo”.

A mensagem para o empresário varejista parte desse exemplo ilustrativo. No lugar de pensar imediatamente numa solução para eventual problema – como é característico do ser humano – o melhor caminho é pensar antes no problema. Porque a solução inicial pode não ser suficiente para resolver o problema. “Se seu pensar no problema eu vou ter um novo ponto de vista e esse novo ponto de vista vai me ajudar a gerar ideias totalmente diferentes das que eu tinha no começo, quando eu estava olhando somente a ponta do iceberg; agora eu consigo enxergar o iceberg todo e criar soluções que funcionem melhor”, finaliza Suzana Leonardi.


Notícias Relacionadas