Especialista diz que reforma tributária beneficiará o Varejo -

Especialista diz que reforma tributária beneficiará o Varejo

Para a Dra Melina Rocha, como a reforma tributária vai simplificar o sistema, diminuir os litígios tributários e diminuir a cumulatividade, o impacto na economia será positivo com crescimento da demanda e do PIB

Varejo SA

Ainda na primeira semana de julho de 2023, o Brasil assistiu a uma votação histórica na Câmara dos Deputados: a aprovação do texto base da reforma tributária (Proposta de Emenda à Constituição 45/19). Depois de 30 anos de discussão, os deputados federais deram o passo histórico rumo à reformulação da tributação sobre o consumo. O presidente da CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas), José César da Costa, acredita que houve “importantes avanços no que diz respeito a simplificação e modernização do sistema tributário brasileiro”.

“A CNDL, principal representante do setor de Comércio e Serviços do país, participou na linha de frente das negociações em torno da aprovação da reforma. Conseguimos juntos que alguns dos nossos pleitos fossem atendidos na reta final, como a preservação do tratamento diferenciado ao Simples Nacional e às cooperativas de crédito, a isenção da cesta básica e a inclusão de bares, restaurantes, hotéis, parques e transporte no regime especial com alíquotas reduzidas”, acrescenta Costa, lembrando ainda que 90% do Sistema CNDL é composto por MPEs (micro e pequenas empresas) e por inúmeros segmentos dentro do Comércio e Serviços que buscam tratamento diferenciado, grande parte justamente de bares e restaurantes.

O texto seguiu para o Senado, onde precisa ser aprovado em dois turnos por, pelo menos, três quintos dos parlamentares (49 senadores) para ser promulgado. Também para o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), a preservação do Simples Nacional e a simplificação das regras tributárias, a fim de melhorar o ambiente de negócios do país, beneficiarão MEIs (microempreendedores individuais) e MPEs.

“Ainda que a proposta da reforma passe por mais debates e alterações durante os trâmites no Congresso Nacional, os pequenos negócios conseguiram, no relatório atual, a manutenção do Simples Nacional, o regime tributário exclusivo para micro e pequenas empresas, que respeita a regra constitucional do tratamento diferenciado e reduz os impostos e a burocracia”, observa o presidente da instituição, Décio Lima.

Na última semana, poucos dias após a votação da PEC 45 na Câmara, conversei via WhatsApp com a Dra. Melina Rocha sobre como impactariam o Varejo as alterações no sistema tributário do país previstas no texto aprovado. A avaliação da especialista é positiva, pois afirma que “vai melhorar o ambiente de negócios, possibilitar mais investimentos e reduzir a cumulatividade do sistema, e com isso, o preço de bens e serviços vão poder ser reduzidos”.

“Acredito que o texto foi muito bem costurado em termos de adotar um IVA (Imposto sobre Valor Agregado) nos melhores padrões internacionais: justamente um sistema de IVA Dual, que concilia os interesses de União, estados e municípios. Então, vejo a aprovação como uma coisa muito positiva para o país, porque a reforma tributária vai promover crescimento econômico e reduzir as desigualdades sociais e as desigualdades regionais também”, ressaltou a tributarista.

A especialista também não acredita que haverá aumento da carga tributária. “Mesmo sem a alíquota estabelecida, há uma previsão no texto de que a alíquota vai ser aquela necessária para justamente compensar a exata arrecadação dos atuais tributos, de modo que não vai haver aumento de carga tributária. Mesmo que ainda não se saiba qual alíquota que vai ser adotada, há garantia constitucional de que não haverá aumento de carga tributária”, explica Melina Rocha.

Melina Rocha é consultora internacional e especialista em IVA, coordenadora-executiva do Projeto IVA no Século XXI, do NEF/FGV-SP (Núcleo de Estudos Fiscais, da Fundação Getúlio Vargas), e diretora de Cursos da York University (Canadá). A tributarias é doutora em Ciência Política e Direito pela Université de la Sorbonne Nouvelle – Paris 3, foi professora da FGV Direito Rio e consultora do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), do Banco Mundial e do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).

Para saber exatamente as alterações propostas pela Câmara dos Deputados no sistema tributário brasileiro, clique aqui.

Confira a conversa com a Dra. Melina Rocha sobre a reforma tributária aprovada pelos deputados e que será debatida no Senado a partir de agosto:

Qual é sua avaliação sobre a reforma tributária aprovada na Câmara?
A minha avaliação é de que a reforma tributária aprovada na Câmara é muito positiva. Depois de quase 30 anos de tentativas para aprová-la, finalmente ela passou pela Câmara dos Deputados, o que é um avanço e uma vitória enorme.

Acredito que o texto foi muito bem costurado em termos de adotar um IVA nos melhores padrões internacionais: justamente um sistema de IVA Dual, que concilia os interesses de União, estados e municípios. Então, vejo a aprovação como uma coisa muito positiva para o país, porque a Reforma Tributária vai promover crescimento econômico e reduzir as desigualdades sociais e as desigualdades regionais também.

É possível mensurar o impacto no comércio e serviços mesmo sem saber a alíquota que vai ser adotada?
Acho que o impacto vai ser positivo para todos os setores, porque a reforma é justamente vai melhorar o ambiente de negócios, possibilitar mais investimentos e reduzir a cumulatividade do sistema, e com isso, o preço de bens e serviços vão poder ser reduzidos. Então, mesmo sem a alíquota estabelecida, há uma previsão no texto de que a alíquota vai ser aquela necessária para justamente compensar a exata arrecadação dos atuais tributos, de modo que não vai haver aumento de carga tributária. Mesmo que ainda não se saiba qual alíquota que vai ser adotada, há garantia constitucional de que não haverá aumento de carga tributária.

Mas, além disso, como a reforma tributária vai simplificar o sistema, diminuir os litígios tributários e diminuir a cumulatividade, o impacto tanto no Comércio quanto no Serviços vai ser já positivo e de crescimento da demanda e do PIB (Produto Interno Bruto), e isso vai afetar todos os setores. Eu não vejo como a reforma tributária pode afetar negativamente, pelo contrário, vai afetar positivamente todos os setores.

Na sua opinião, o que precisará ser ajustado no Senado para evitar um impacto negativo no Varejo?
Com relação ao Varejo, acredito que não haverá nenhum ajuste a ser feito para evitar impacto negativo. Como falei, não vejo impacto negativo no setor, pelo contrário, o Varejo hoje tem muito imposto acumulado na cadeia, resíduo tributário tanto de operações – aquisições próprias que o Varejo não pode se creditar – quanto de toda a cumulatividade anterior da cadeia. Então, desde o produtor rural até a fábrica/indústria ou até a distribuidora, em todas essas etapas há um resíduo tributário na cadeia enorme. Estima-se que mais de 10% da receita líquida do Varejo seja composta justamente por resíduos tributários, que são impostos que incidem em toda a cadeia, mas que não são possíveis de serem recuperados como crédito, e isso entra como custo no preço do produto e do serviço e aumenta os preços que são praticados tanto no meio da cadeia quanto ao consumidor final.

Quando a reforma tributária propõe uma não cumulatividade plena, ou seja, o creditamento total de todos os insumos que são usados na cadeia produtiva, esse custo tributário desaparece, esses resíduos desaparecem, e a consequência imediata é uma redução dos preços que são praticados tanto nas compras do Varejo quanto na venda ao consumidor final, o que quer dizer que o setor vai ser totalmente desonerado por conta da não cumulatividade plena que vai ser trazida pela reforma tributária e hoje, eu repito, não existe. Temos muita cumulatividade e impacto no preço por conta desses impostos não recuperáveis que viram custo.

O setor de serviços representa aproximadamente 71% do PIB do Brasil. É a categoria que mais emprega no país. No entanto, é um dos setores mais atingidos na reforma. Isso vai implicar em aumento de desemprego?
O setor de serviços representa 71% do PIB, mas quando a gente olha a decomposição desses 71%, uma grande parte é composta pela Administração Pública, que entra nesse 71% como setor de Serviços, e Administração Pública não é impactada. Outra parte é composta de serviços prestados no meio da cadeia, que serão beneficiados pela reforma tributária porque eles tomarão crédito de todos os insumos e aquisições, que hoje não tomam – e isso gera custo e aumento o preço do serviço –, além de poderem repassar o crédito – que hoje não é possível – com o ISS, que é cumulativo.

Então, quando um prestador de serviço presta serviço por R$ 100 a uma determinada empresa no meio da cadeia, hoje, o ISS que incide sobre isso vira custo, ou seja, aumenta o preço do serviço para o tomador. Com o IVA, qualquer alíquota que seja aplicada, o tomador de serviços vai tomar crédito integral do IVA que for pago, ou seja, eles vão pagar o preço só referente ao serviço, e não mais o preço referente ao imposto pago. Isso não é mais custo para eles, não faz parte do preço porque vai ser totalmente recuperado. Então, no meio da cadeia, realmente o setor de serviço vai ser beneficiado.

Só sobre uma pequena parte, cerca de 13% desses 71%, que presta serviço ao consumidor final (que pode ter aumento de alíquota). Mas dessa parte, 90% – a imensa a maioria de prestadores de serviços ao consumidores finais – estão no Simples ou no MEI, que não serão impactados porque poderá continuar nesse regime, que será mantido na reforma tributária.

A verdade é que uma pequena parcela, fora do Simples e MEI e que presta serviço a consumidor final, poderia ser impactada, mas como eu falei: é 13% desses 71%, e desses 13%, 90% está no Simples ou no MEI. Então, na verdade, são 10% dos 13% do 71%. É uma pequeníssima parcela, e por isso que esse número colocado dessa forma não está correto.

A Reforma atua basicamente na simplificação do sistema tributário, o que favorece, principalmente, as micro e pequenas empresas. Os ganhos com a simplificação são capazes de suplantar o peso dos impostos do novo modelo?
Na verdade, como eu falei, haverá uma desoneração da cadeia produtiva, ou seja, Varejo, Distribuidora, Indústria, todos serão desonerados por terem creditamento total. Não recairá sobre eles nenhum imposto como hoje recai e vira custo. Então, a cadeia produtiva vai ser desonerada. Não tem peso dos impostos porque esses impostos não vão ser suportados pelo Varejo nem pela Indústria, que serão desonerados por conta da não cumulatividade plena.

A nova alíquota ainda não foi definida. Mas tudo indica que estamos caminhando para um patamar de 25%. Se for essa a alíquota, qual será o impacto no Varejo?
Hoje, só o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) é de 18% e o PIS/Cofins (Programa de Integração Social/Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) é de 9,25%. Esses dois tributos juntos são calculados por dentro, o que quer dizer que nesses dois tributos a alíquota realmente incidente, só considerando PIS, Cofins e ICMS, corresponde a 34.4% por fora. Então, a gente já tem uma alíquota para alguns produtos de 34.4%, porque eles são calculados por dentro, e a alíquota nominal é 18% + 9,25%.

A alíquota de 25% não tem como ser comparada com as alíquotas atuais, porque vai haver uma redução do preço pela eliminação dos resíduos da cadeia, pela eliminação desses custos de tributos que não são recuperáveis, e com isso, não tem como comparar a alíquota atual, que já é alta e calculada por dentro. Então, mesmo em uma comparação da alíquota nominal, já está mais alta que 25%.

Essa alíquota de 25% é, primeiramente, calculada por fora; e segundo, vai ser uma alíquota limpa, sem resíduo tributário das operações anteriores, tributos não recuperados ao longo da cadeia, o que aumenta o preço e, por consequência, aumenta a alíquota efetiva também, porque há tributo sobre tributo incidindo/embutido no preço, escondido no preço.

Na aprovação da Reforma, houve muita negociação para incluir setores e produtos no grupo de alíquota reduzida. Isso pode interferir no valor final da alíquota?
Realmente, houve algumas negociações políticas – que faz parte do jogo –para justamente incluir a alíquota reduzida. Uma redução de 60% da alíquota padrão, ou seja, vira 40% da alíquota padrão. Podem impactar o valor da alíquota padrão se muitos setores forem incluídos na alíquota reduzida, especialmente porque a premissa é de que não haja aumento de carga tributária e a arrecadação compense a arrecadação dos atuais tributos. Então, vai haver algum Impacto. Ninguém tem esse número, mas faz parte.

A “gestão” dos impostos é um dos principais desafios para os negócios. Como este período de transição funcionará? Haverá trabalho em dobro?
Durante o período de transição para os contribuintes, não haverá trabalho em dobro, pois tanto a CBS (Imposto sobre Bens e Serviços) quanto o IBS (Contribuição Social sobre Bens e Serviços) serão de simples apuração, uma apuração automática e, de preferência, feita pelo próprio Conselho Federativo. A única obrigação que o varejo ou qualquer outra empresa terá é o de emitir a nota fiscal, colocando o CNPJ nas aquisições. O Conselho vai ter toda a estrutura tecnológica para já apurar créditos e débitos, e assim de forma muito facilitada o imposto a recolher. Então, não haverá trabalho em dobro, não vai ter mais obrigação acessória, porque a apuração desse imposto, tanto do IBS quanto da CBS, será simplificada e automática.

Para a empresa do Simples, não muda nada e ainda vai ter a opção, se achar que é vantajoso, de sair do sistema só para fins do IBS, ou seja, recolher o IBS/CBS fora do Simples, no meio de crédito/débito. Então, ainda há a opção de optar pelo melhor modelo, seja Simples, seja o IBS, seja um regime normal, conforme cada empresa fizer as contas do que for mais vantajoso.

A reforma vai trazer benefício para empresa do Simples; opção, caso quiser sair do Simples só para o IBS/CBS; e ainda há a previsão de que os adquirentes do Simples poderão tomar crédito sobre o valor recolhido pelo Simples. Não vai ser o valor da alíquota cheia do IBS, porque na incidência da venda pelo Simples, vai ter a incidência da alíquota do Simples. Então, o adquirente vai tomar crédito pelo valor recolhido do Simples, o que é uma coisa muito benéfica para todo o sistema.

Com relação ao sistema tecnológico, se prevê que vai haver um conselho federativo, então, um único fisco que as empresas terão que recolher, ao invés de lidar com 27 estados, 5.570 municípios. Vai ser uma arrecadação integrada, um algoritmo no qual a apuração vai ser automática e vai fazer o cálculo de quanto deverá ser recolhido, então, débito menos crédito. Tudo isso será automático.

O Brasil é um dos pioneiros na adoção da nota fiscal eletrônica, tem longa experiência, e essa nota fiscal vai ser justamente utilizada para essa apuração eletrônica. Sou muito otimista! O Brasil em comparação com outros países é pioneiro nesse avanço tecnológico para o recolhimento de tributo.


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