Especialistas em varejo discutem tendências e perspectivas para o setor em 2016 -

Especialistas em varejo discutem tendências e perspectivas para o setor em 2016

FGV promove evento que debate a importância da adoção de novas tecnologias e os princípios básicos da boa gestão

 Lucas Torres

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Em mais uma ação coordenada pelo Centro de Excelência em Varejo, a Fundação Getúlio Vargas realizou em 22 de março o evento “Tendências e Perspectivas para o Varejo 2016”. Tendo como destaque as participações da especialista em tecnologia da Vip-System, Regiane Relva Romano, e o consagrado pesquisador Juracy Parente, o encontro abordou temas que serão fundamentais para o setor nos próximos meses, bem como princípios básicos da administração varejista que se constituem em elementos atemporais para o sucesso de empresas no mundo todo.

Doutora em administração de empresas com foco em administração da tecnologia da informação pela FGV-EAESP, Regiane Romano iniciou sua apresentação dando um aviso enfático aos varejistas: tecnologia não é somente software, é modo de pensar.

Com isso a palestrante passou a desmistificar qualquer ideia de inacessibilidade tecnológica para as empresas do setor, seja qual for o tamanho do negócio e sua capacidade de investimento. Em seguida, frases fortes como “quem não tem wi-fi em sua loja hoje está morto” e “isso que a gente chama de futuro já é presente e vai virar passado rapidamente” trataram de motivar os participantes e coloca-los no clima propício para a absorção total dos conceitos que se seguiriam.

E foram muitos os conceitos. A começar pela derrubada do badalado omni-channel, que foi rapidamente substituído pela ideia de one-channel. A diferença básica de um para outro é que o segundo deixa de oferecer vários canais que confluem para um único ponto e configura em um único ponto que pode ser alcançado por meio de diversos canais.

Não entendeu? É simples. No one-channel tudo se torna um PDV. Com sua implantação na íntegra, o cliente pode visitar a loja física e comprar algo pelo internet de forma autônoma de dentro da loja – que por sua vez oferece tablets para tornar essa ação possível, ainda que o consumidor não possua um smartphone. “Você quer comprar pelo telefone, eu vendo pra você. Você quer comprar pelo Instagram, pelo Facebook, pessoalmente? Eu vendo pra você”, sintetizou Regiane.

A ideia do conceito é oferecer uma experiência inesquecível ao consumidor com originalidade e personalização. Tudo isso para atender aos chamados ‘Milenials’, ou seja, à geração de jovens que buscam valor agregado no produto a ser consumido. Muito mais que preço baixo ou utilidade, o cliente busca se identificar com a loja, ter uma espécie de ‘orgulho’ por ter comprado ali. “As pessoas mudaram. Precisamos conhecê-las novamente”, afirmou a palestrante.

Robótica também é tendência para o varejo

Regiane Relva Romano apresentou no evento uma série de cases que ilustram as novidades implantadas por varejo do mundo todo e que foram demonstradas, principalmente, durante a última NRF – principal evento do setor em todo o planeta.

Dentre as novidades apresentadas destacou-se a tendência de maior engajamento da robótica nos pontos de venda. São muitas as aplicações de tal tecnologia no setor e sua gama de aplicações vai da apresentação interativa da loja por meio de um sistema de perguntas e respostas a atividades mais sofisticadas que nos remetem ao que, há não muito tempo, era considerado mera ficção científica, como a utilização de robôs que trabalham como recepcionistas.

Quiosques 3D, realidade virtual e personalização de produtos por meio de impressoras 3D foram outras tendências para o varejo apresentadas pela especialista.

 De volta ao básico

Autor de livros como ‘Varejo para Baixa Renda’ e ‘Varejo no Brasil: Gestão e Estratégia’, o acadêmico e empresário Juracy Parente focou a atenção aos preceitos básicos da administração eficiente no varejo. O tema da palestra lembrou aos participantes algo como ‘inovar é importante, mas fazer o arroz com feijão é imprescindível’.

O palestrante conduziu sua apresentação em torno de sete itens fundamentais para o sucesso de qualquer varejista em qualquer segmento: estratégia clara e diferenciada; eficiência na execução; foco obsessivo no cliente; parcerias e alianças; inovação; liderança e alinhamento; e construção da marca.

Em relação ao primeiro atributo citado, Parente destacou a importância de orientar a loja para um nicho específico, com objetivos também específicos. Ou seja, é pertinente identificar o mercado alvo e estabelecer um formato específico de varejo.

Para o palestrante, buscar atender a todos os requisitos de qualidade impostos pelo mercado é uma armadilha para qualquer varejista. É preciso fazer escolhas, evitar o que ele chama de ‘buraco negro’ e deixar de ser mediano em diversos aspectos com o objetivo de atingir a excelência em temas específicos.

“É preciso ter coragem para dizer não. Como fez, por exemplo, o Dia %, empresa que abre mão da variedade e da alta qualidade para atender ao seu nicho de mercado, constituído basicamente por clientes em busca de preço baixo”, ilustra.

Alcançar o balanço exato entre estratégia e execução é outro fator a ser seguido pelos varejistas. Para isso Parente salienta a importância de se utilizar indicadores que propiciem otimizar os resultados, evitando desperdício de espaço com uma baixa taxa de vendas por metro quadrado, faltas no estoque ou um turnover de funcionários muito elevado, por exemplo.

A fim de alcançar esse equilíbrio, o palestrante sugeriu que os varejistas começassem a fazer uma análise comparativa entre o benchmark (as empresas de maiores sucessos) com a realidade de suas lojas. Assim, os empresários sairiam do plano da ideia estratégica para a verificação prática do desempenho cotidiano, podendo desta feita ajustar os pontos falhos e ineficientes da administração do negócio.

Experiência de compra deve sempre ser positiva para o cliente

A busca por propiciar experiências prazerosas aos clientes foi destaque entre as orientações de Juracy Parente para os varejistas. O acadêmico relembrou os “Milenials” para levantar a necessidade de posicionamento do varejo na sociedade. Buscar identificar o negócio com um certo setor da sociedade, para que esta lhe seja fiel independentemente de preço baixo ou outros eventos sazonais.

Para melhor atender aos clientes, Parente propôs uma análise de taxa de recomendação. Um questionário que descobriria quantos dos clientes da loja recomendariam a empresa para alguém de seu meio e convívio. Tal análise se daria por meio da atribuição de notas ao atendimento. Caso o cliente desse uma nota de 9 a 10, ele se configuraria em um promotor do negócio; de 8,7 agiria de forma passiva; de 0 a 6 o cliente passaria a ser um detrator daquela loja.

Segundo o palestrante, a relação com os clientes e sua posição na sociedade é o ponto de maior impacto para o sucesso de um varejo.

Por fim, Parente abordou o tema das parcerias e alianças. Não somente com outras lojas na relação que conhecemos como ‘redes de varejo’, mas também com os funcionários. Tal tipo de parceria – em geral dada pela atribuição de significado ao emprego do colaborador – faz com que este tenha atitudes identificadas com a missão e a visão da empresa, ocasionando em melhores serviços prestados e diminuição da taxa de turnover da empresa.

Infraestrutura é entrave para retomar crescimento

 Em face do cenário de efervescência vivido pelo país, discutir qualquer assunto nos meios empresarial ou acadêmico sem que se debata de maneira amplificada os macrotemas nacionais se tornou um exercício impensável. No evento “Tendências e Perspectivas para o Varejo 2016”, promovido pela FGV, não foi diferente.

A economia do Brasil foi discutida pelo consultor da Organização das Nações Unidas e doutor em economia pela Universidade de São Paulo, Marcos Fernandes, que iniciou sua apresentação pontuando as três características necessárias para o crescimento de um país – inovação tecnológica, investimento em infraestrutura e investimento em educação.

Segundo Fernandes, o maior entrave para que a economia nacional volte a crescer é o problema da infraestrutura, chamado pelo economista de ‘fronteira da eficiência’.

Para o doutor, a crise institucional atravessada pelo país é somente um agravante para os problemas estruturais que já existem. “Vamos supor que a presidente da República saia amanhã. O início da melhora econômica, por meio do que chamo de ‘mudança de humor’, se dá logo no dia seguinte, entretanto, para voltarmos a crescer, é necessário que se realize diversas reformas no país e isso se dará somente a médio prazo”, analisa.

Além da questão da infraestrutura, o palestrante destaca a importância de uma simplificação tributária e a revisão dos serviços previdenciários. “Nossas últimas reformas importantes foram realizadas no primeiro mandado do ex-presidente Lula. Na ocasião as medidas foram eficientes, entretanto, de lá para cá, já se passaram 12 anos e a economia ancorada no consumo já não é suficiente para darmos o próximo passo do qual tanto precisamos”, finaliza.

O responsável por analisar o cenário político do país foi Cláudio Gonçalves Couto, doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo.

Couto afirmou crer que a crise institucional vivida pelo país advém de uma profunda falta de líderes e da polarização da sociedade em torno de candidatos que – no fundo – não representam seus eleitores.

O palestrante citou ainda o problema moral vivido na política brasileira. “O governo petista deu uma profunda autonomia para a Polícia Federal. Se observarmos os dados, o número de operações da PF cresceu exponencialmente de 2003 pra cá. Entretanto ele não se policiou para não incorrer em crimes que fizessem essa medida se virar contra ele próprio”, disse.

Segundo o cientista político, essa situação chegou ao auge de sua insustentabilidade, ao passo que o Partido dos Trabalhadores já não possui credibilidade junto à opinião pública e tampouco possui o respaldo do poder legislativo, sobretudo pelo fato de que grande parte dos parlamentares sofrem igualmente os efeitos da maior autonomia da PF.

“Muitos parlamentares acreditam que a queda do atual governo provocará um abrandamento da operação lava-jato. Obviamente esse não é o único motivo que aumenta as possibilidades de um eventual impedimento da presidente, mas desempenha um papel importante nesse processo”, ponderou.

Por fim, Couto disse crer que enquanto a crise institucional não for resolvida, os mais variados setores do país continuarão pagando a conta, inclusive – é claro – o varejo.

 

 

 


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