Interesse público e sustentabilidade ficam em segundo plano -

Interesse público e sustentabilidade ficam em segundo plano

Para a doutora em Ciências Políticas e diretora Executiva da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS), Mônica Sodré, a melhor de definição de democracia é: ‘regime no qual vence a maioria, mas que a minoria possui representatividade real’.

Por essa ótica, é possível contestar o caráter antidemocrático do monopólio no estabelecimento de diretrizes de operação do mercado automotivo por parte das montadoras – maioria nas esferas representativa e econômica em função de sua rápida geração de impostos e empregos no atacado, atributos estes de interesse do governo.

Para o diretor de Relações Institucionais do Sindirepa Nacional, Sérgio Alvarenga, as diretrizes estabelecidas pelo programa Rota 2030 deixam evidente que esse poder de influência tem feito com que o governo brasileiro ainda enxergue a cadeia automotiva de maneira extremamente restrita. “Ele abrange apenas fornecedores de autopeças e montadoras de veículos no que tange à produção de veículos automotores novos e não visualiza o veículo em uso ou mesmo até seu final de vida útil, o que compreenderia questões como inspeção técnica veicular; sucateamento sustentável; engenharia reversa de componentes; produção com regras claras para desmonte ao final de vida útil; certificação compulsória de todos os componentes relacionados à segurança e de emissões, entre várias outras questões”, aponta.

Alvarenga reconhece que, no estado democrático moderno, a sociedade organizada deve influenciar e se manifestar sobre os pleitos. Mas, antes das questões de nicho e interesse empresarial, é preciso que o governo pese interesses comuns da sociedade unificada, lembrando que os temas reivindicados pelo aftermarket não são pauta exclusiva do segmento, muitos deles têm relação direta com a agenda ambiental.

“Tais posições devem estar muito bem articuladas com a sociedade como um todo, ou seja, temas relacionados ao meio ambiente não deveriam estar fora da pauta, até porque já temos regulamentações demais e pouco utilizadas ou mesmo aproveitadas pela cadeia automotiva”, coloca.

Na mesma linha de Alvarenga, o presidente do Sincopeças Brasil, Ranieri Leitão, lamenta o fato de os setores de reposição de autopeças e reparação automotiva terem ‘zero poder de influência’ no andamento das pautas no Congresso Nacional. “Nós não temos congressistas que representem o setor. Portanto, para a gente colocar em pauta no Congresso Nacional hoje um assunto que seja de responsabilidade social e, ao mesmo tempo, importante para nosso segmento, temos muitas dificuldades. Infelizmente, se não houver um apelo popular muito forte, nenhum deputado vai fazer projeto de lei ou votar a favor do que já está tramitando por lá. Até porque o lobby das montadoras é simplesmente violento e nós não temos representatividade. Essa é a realidade, infelizmente”, finaliza Leitão.

Questionados sobre a possibilidade da alteração desse quadro após as próximas eleições, as duas lideranças se mostram céticas. Para ambos, eleger candidatos comprometidos com o aftermarket foi apenas um sonho antigo e fora de cogitação no momento atual.

Sem cadeiras no parlamento, Leitão e Alvarenga apontam a união das instituições representantes dos mais diferentes elos da reposição como um atenuante mais realista.

O primeiro conta que durante a Autop 2018, realizada no mês passado, entidades como Sindipeças, Andap/Sicap, Grupo de Manutenção Automotiva e Sincopeças Brasil estiveram reunidas a fim de iniciar um movimento que encontre soluções para inserir os temas caros ao setor na agenda pública em âmbito nacional.

Durante o encontro, Leitão pediu a palavra para solicitar que as lideranças fizessem uma pauta de reivindicações unificada que possa ser levada ao novo presidente da República no próximo mês de março.

Simpatizante da ideia, Alvarenga afirma que tal união das entidades em torno de uma agenda única tem o potencial de, ao menos, minimizar a lacuna de representatividade que há muito acompanha o aftermarket.


Notícias Relacionadas