Lideranças debatem tecnologias e tendências na reposição -

Lideranças debatem tecnologias e tendências na reposição

Carro híbrido, elétrico, conectado, compartilhado, complicado. A matéria prima do mercado de reposição – o automóvel – está passando por um processo evolutivo que abre a perspectiva de fortes impactos nos negócios de todos os elos da cadeia do setor. O que nos espera? Para onde vamos?

No Seminário da Reposição Automotiva, realizado em 11 de outubro, um painel de debates reuniu algumas das principais lideranças do aftermarket com o propósito de discutir as últimas tendências e apontar os caminhos para adequação das empresas.

O encontro, mediado por Antonio Fiola, presidente do Sindirepa-SP e do Sindirepa Nacional, reuniu Elias Mufarej, coordenador do GMA – Grupo de Manutenção Automotiva; Antonio Carlos de Paula, diretor de vendas da Distribuidora Automotiva e da Pellegrino; Francisco de La Tôrre, presidente do Sincopeças-SP e José Arnaldo Laguna, vice-presidente do Sindirepa-SP e presidente do Conarem, Conselho Nacional de Retífica de Motores.


ANTÔNIO FIOLA

A retífica de motor deve sofrer um grande impacto nos próximos anos. Como o setor enxerga o avanço das alternativas energéticas, como o veículo híbrido e o elétrico?

 JOSÉ ARNALDO LAGUNA

É um grande desafio. Três anos atrás, quando neste seminário se falou em conectividade, eu fui conhecer a tecnologia na Delphi, em Detroit, para entender o que a fábrica pensava em termos de conectar o automóvel, o consumidor, o fabricante e como o setor de serviços se conectaria aos fabricantes, às novas tecnologias. E há dois anos visitei o centro de treinamento da Bosch em Stuttgart e vi o seguinte cenário: carro híbrido uma realidade e carro elétrico uma solução para o meio ambiente Porém, naquele momento, a bateria do elétrico custaria cerca de 30 mil reais. Aquilo me tranquilizou, pois o carro elétrico demoraria a chegar ao Brasil. E a autonomia era, então, de 180 a 200 quilômetros. Hoje as baterias já têm 600 quilômetros de autonomia. Então, o carro elétrico passou a ser, para mim, muito mais preocupante hoje. Eu só não sei quanto vai custar esse carro aqui. Já na linha diesel, entendemos que o Euro 6 é o estado da arte, isso não muda por enquanto, todo o transporte, o setor pesado e agrícola continuam com a estrutura do motor a combustão interna. Mas na linha leve a nova tendência poderá nos atropelar com certa velocidade e isso vai afetar o movimento da retífica no longo prazo. Também estive na linha de montagem da Toyota, no Japão. A montadora avisou que em 2050 não fabricará mais carro com motor a combustão interna. Lá vi os carros híbridos em produção e, inclusive, um modelo a célula de hidrogênio já na linha de montagem. Nós temos que acender uma luzinha de preocupação, temos que preparar a cadeia como um todo porque essas novidades poderão se tornar realidade. Em minha cidade, eu vi um anúncio de eletrificação das residências por captação de energia solar. Aí acendeu a luz vermelha de vez. Seu eu montar uma captação de energia solar em casa e, tendo sobra de energia, posso carregar meus automóveis à noite. Com 600 quilômetros de autonomia eu ando um mês com a carga.

 

ANTÔNIO FIOLA

Hoje 95% dos veículos nos Estados Unidos vão para reciclagem e no Brasil o índice é próximo de 1,5%. E ainda temos muitos daqueles desmanches não é desejáveis. São 5,5 mil municípios no Brasil, uma frota de 42 milhões de veículos, com quase 500 modelos diferentes. O carro bate muito mais de frente que de lado, se a gente começar a fazer essas contas não vai sobrar muita peça por município. Mas é um dever nosso pensar nessa reciclagem. Como a nossa indústria vê o programa de reciclagem?

ELIAS MUFAREJ

É uma questão polêmica porque atinge um ponto central do nosso problema, o desmanche, que é a legalização, fundamentalmente fazer com que a recuperação dos veículos seja feita de forma adequada, legal e profissional. Um dos problemas é que não existe no Brasil a consciência e uma política para a renovação da frota. Esse projeto foi apresentado pelo Sindipeças há quatro anos, teve boa receptividade do governo, mas faltou o mais importante: os investidores. A renovação de frota traria, por consequência, a indústria de reciclagem e recuperação das peças desses veículos. Isso não aconteceu, nós estamos numa fase muito primária. Há necessidade de se fazer um trabalho mais consistente e, principalmente, atrair investidores. Nos Estados Unidos, o reaproveitamento dos veículos é um excelente negócio. Esse tema polêmico deve acompanhar nossas reuniões no GMA a fim de que possamos contribuir para que os carros fora de uso sejam reciclados de forma que o processo não passe por algum tipo de ilegalidade, tornando-se um negócio provavelmente bastante interessante nos próximos anos.

 

ANTÔNIO FIOLA

São temas polêmicos, mas enquanto estamos aqui há reparadores lá fora comprando peças e a gente nem sempre sabe a procedência desses componentes. O mecânico é responsável pela peça que aplica, então esses alertas são importantes. Precisamos ter consciência de que não podemos comprar peças de procedência duvidosa. E há muitos desafios também pra o distribuidor. Como fidelizar o cliente numa época de smartphone, conectividade e acesso à informação?

ANTONIO CARLOS DE PAULA

No Brasil nós temos uma distribuição bastante organizada, um modelo onde existem diversos distribuidores, que proporcionam capilaridade nos 5,5 mil municípios. Os fabricantes acreditam nesse modelo e os varejos também acreditam, tanto é que a maioria dos distribuidores tem sua forma de fidelizar e fazer negócios. É uma parte da questão. Em relação à conectividade, ainda não há uma ideia de como vai funcionar. Há muitas tendências, que na minha visão ainda estão um pouco distantes. Entendo que isso pode ser um problema para as oficinas independentes, que talvez não estejam preparadas para fazer essa reparação. Em relação à fidelização do varejo, como distribuidor eu entendo que ainda é o momento do modelo tradicional, ainda não vejo uma solução além disso.

 

ANTÔNIO FIOLA

Às vezes a oficina se depara com o cliente que recebe o orçamento e diz que viu a peça pela metade do preço no Mercado Livre. E aí a gente tem um frio na espinha, a peça pode vir errada porque a montadora tem uma diversidade de modelos para a mesma peça. Nesse momento em que o preço e a cotação tentam substituir o relacionamento que a oficina mantém com o varejo, pautado pela confiança, como o varejo vê o impacto da inovação no acesso à informação do preço para o modelo futuro de negócio?

FRANCISCO DE LA TÔRRE

Eu defendo que o ponto de venda tem que ocupar todos os canais possíveis. Loja física, internet, smartphone, telemarketing. E o ponto de venda leva vantagem porque existe fisicamente. Nosso segmento tem outra característica: se trata de uma venda técnica onde também existe uma taxa de retorno muito grande e ele pode prestar esse serviço com mais qualidade do que certas plataformas, que podem ser até perigosas. Você vê uma série de ofertas de produtos, mas não sabe a procedência, muitas vezes essa venda é feita por uma pessoa física, não tem nem CNPJ para vender. Então, diante disso tudo, eu enxergo como uma oportunidade para o varejo comercializar não mais exclusivamente no seu entorno, mas poder, principalmente, desovar peças que quando entraram na prateleira eram de curvas A e B e, com o passar do tempo, se tornaram C e D. Ele pode vender isso para outras regiões. Você não pereniza na venda por internet só pelo preço, o consumidor consulta o preço, mas quando ele tem acesso a um monte de informações ele vai olhar o ranking dessa empresa na plataforma que está utilizando, vai checar as redes sociais para ver se tem gente falando mal daquela empresa. Então, o preço é um fator importante, mas mesmo com essas novas tecnologias não é mais o fator fundamental e decisório da compra. Um dos desafios que eu também coloco é que é preciso tornar o ponto de venda uma experiência de consumo, todo mundo gosta de ir a um ambiente agradável, ser bem tratado, ter contato com o produto, explorar as várias possibilidades de consumo. Eu sei que autopeça é um produto de demanda inelástica, mas o automóvel ainda é um fetiche na cabeça do consumidor e é bom encontrar na loja uma série de produtos sendo ofertados, um acessório, um cheirinho. Hoje, por exemplo, é comum encontrar em varejo de autopeças acessórios para smartphone. Esse modelo de loja é o que tende a prevalecer, saber como proporcionar uma boa experiência de consumo ao cliente.

 

ANTÔNIO FIOLA

Será que é possível, através de aplicativos ou de um software, a gente conseguir uma linha consistente de geração de demanda para indústria, distribuidor e varejo?

ELIAS MUFAREJ

Em 2002 eu fui convidado pela Oracle para participar de uma convenção em San Diego, na Califórnia. Uma das conclusões dessa convenção era que os aplicativos dominariam o mundo dos negócios. Isso foi há quase 15 anos. Hoje todos temos um aplicativo no celular. Nós já estamos sendo dominados por essa tecnologia, e o recado que eu deixo é que nosso setor precisa se adaptar melhor a essa realidade porque os novos negócios evoluirão em cima dos aplicativos.

 

ANTÔNIO FIOLA

Será que quando tiver um aplicativo da loja na oficina vai ser possível saber o que eu vou comprar?

FRANCISCO DE LA TÔRRE

As mudanças, quando ocorrem, vão sendo introduzidas gradativamente. Veio a injeção eletrônica e o mercado se adaptou, o mecânico se preparou. Nós já estamos calejados com as transformações tecnológicas porque o automóvel tem uma velocidade muito grande na sua evolução e o mercado sempre se adaptou bem. O diferencial que temos agora são mudanças qualitativas, vai se alterar a relação de uso, a relação de consumo, mas o nosso segmento também já vem acompanhando isso. Hoje nós já temos um mapa de geoposicionamento das oficinas, com as suas demandas. Temos o aplicativo Carro 100%, o setor tem um produto que acaba favorecendo a geração de demanda e se relacionando com o consumidor final. Isso é importante para percebermos como as transformações vão entrando no dia a dia, o nosso business vem absorvendo isso como ocorre em todos os outros segmentos. Eu me sinto tranquilo em relação às transformações, a gente vai se adaptando e se ajustando muito rapidamente.

 

ANTÔNIO FIOLA

Será possível ter uma solução automática que já gere o pedido para o varejo?

ANTONIO CARLOS DE PAULA

Possível é, mas eu sou muito cético com relação a certas coisas. Hoje no relacionamento entre fabricante e distribuidor se você fala em abastecimento automático para a demanda, as fábricas fogem, o setor não quer ouvir sobre isso. Se a gente não consegue conectar a primeira parte, que é o relacionamento de fabricante com o distribuidor, fica complicado. Eu acho que o relacionamento do varejo com o consumidor para uma peça automotiva também é um pouco complicado, leva em conta o aplicador; uma coisa é pegar a peça e levar à oficina de alguém para aplicar, chega lá ele começa a olhar a peça, não tem garantia, então vai cobrar a mais. Tem tudo isso para ser resolvido. Mas eu acredito que a distribuição, dentro do possível, está apta hoje a fazer conexão com os varejos. Mas, afinal, acho que a gente tem um monte de ideias, mas muitas vezes não consegue aplicá-las nas coisas mais óbvias.

 

ANTÔNIO FIOLA

Como a retifica de motores vê todas essas tendências?

JOSÉ ARNALDO LAGUNA

Nós constituímos uma rede de compras para poder ter volume, preço e competitividade na ponta. O aplicativo esta aí, o excesso de ofertas, os importados, existe distribuidor de primeira, segunda e terceira linha. Tudo isso acaba atrapalhando o mercado e impacta diretamente nosso negócio porque 55% do nosso faturamento é peça. Se vender só usinagem, a empresa não sobrevive. Então fomos atrás de uma solução, ou comprar direto ou importar. Mas é importante que a gente consiga, no final, ter o peço, porque o balizador do preço hoje é o componente remanufaturado. Se a gente não conseguir ter um preço que possa competir com o remanufaturado a indústria toma esse segmento e aí todo o setor da reparação acaba perdendo uma grande fatia da área de motor e transmissão. Não podemos perder esse foco. A competitividade ainda é um ponto crucial no fechamento de um negócio.


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