Lucas Torres jornalismo@novomeio.com.br
O ano de 2021 vai chegando ao fim com um misto de notícias animadoras vindas do âmbito sanitário e as legítimas preocupações que chegam do ambiente econômico. Este contraste entre as duas áreas está explícito em números que expressam uma realidade difícil de ser interpretada à primeira vista. Ao mesmo tempo em que temos hoje uma das maiores taxas de vacinação entre todas as nações do globo – com 62,25% da população totalmente imunizada no fechamento desta edição –, segmentos cruciais para a economia nacional, como o varejo, sofrem uma desaceleração robusta, como a queda de 1,3% registrada em setembro no comparativo com o mês anterior, a maior no período desde o início da Pesquisa Mensal do Comércio do IBGE, no ano 2000.
Mas, afinal, o que gerou, em 2021, este cenário tão distante das expectativas de analistas que apontavam para uma relação diretamente proporcional entre a redução dos impactos da covid-19 na saúde pública e a recuperação imediata do consumo e da saúde das empresas? Para o analista político e econômico da Prospectiva Consultoria, Adriano Laureno, a principal razão para este movimento foi o fracasso do governo em criar um plano de recuperação consistente para o momento pós covid. “
O governo não foi capaz de criar um horizonte decisório estável para os investidores que, diante disso, adotaram uma postura bastante cautelosa na hora de aplicar os seus recursos”, aponta Laureno. Sobre isso, o economista membro do conselho deliberativo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Alessandro Azzoni, dá um passo adiante ao apontar que este ambiente de incertezas gerou uma espécie de ‘fuga do capital estrangeiro’, em um movimento que, dentre outras coisas, causou a desvalorização de nossa moeda e contribuiu de maneira decisiva para uma de nossas principais mazelas do momento: a inflação.
É impossível, aliás, fazer uma retrospectiva do ano de 2021 sem dar o devido protagonismo ao aumento substancial dos preços de maneira pulverizada nos mais diferentes segmentos de nossa economia. Isso porque, nos últimos 12 meses, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) saltou expressivos 10,67%, algo que, na opinião do coordenador do Observatório Econômico da Universidade Metodista, Sandro Maskio, foi, ao lado do elevado índice de desemprego, o principal inibidor de uma demanda reprimida que, em tese, buscaria ser satisfeita assim que diminuídas as restrições voltadas à contenção da pandemia.
Ao ser questionado sobre a possibilidade de o Brasil ter ‘perdido o bonde’ de um possível boom do consumo nos primeiros meses do pós-covid, o acadêmico afirmou já ter, há tempos, adotado uma postura de ceticismo diante desta noção. E, sendo assim, ele vê como natural o fato de o varejo como setor seguir estagnado em um momento em que cidades como São Paulo já vislumbram o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em áreas abertas – deixamos de lado nesta reportagem qualquer perspectiva de retrocesso em função da nova variante Ômicron simplesmente porque ainda não há informações consistentes sobre seus impactos na pandemia e muito menos sobre eventuais estratégias diferenciadas que possam se tornar necessárias para prevenção e combate.
“O desemprego e a queda do poder de compra da população limitam muito a expectativa de concretização de uma demanda reprimida”, afirmou Maskio, antes de complementar: “Sobretudo se observarmos que, quase tão ruim quanto o fato de termos 30 milhões de desempregados (contabilizando os subocupados), é que os empregos gerados estão – além de vindos pela via informal em sua maioria – sendo preenchidos com uma faixa de renda bastante abaixo na comparação com os empregos perdidos no ano passado”. Salários menores e inflação em alta representam uma combinação que não pode dar em outra coisa que não seja significativa redução do poder de compra dos consumidores.
O que esperar de 2022
Restam menos de 30 dias para o final do ano, algo que para a maioria da população, dos empresários a assalariados, representa uma espécie de alívio e renovação da esperança de que ventos mais favoráveis possam soprar em nosso país a partir da virada do calendário. Mas será que essa esperança tão importante para nos permitir ter resiliência nos momentos difíceis tem algum tipo de respaldo na visão dos economistas? A boa notícia é que, diferente da unanimidade que une os analistas ouvidos por nossa reportagem em torno da conclusão de que 2021 foi uma espécie de ‘catástrofe econômica’, há divergências importantes quando o assunto passa a ser as perspectivas para 2022. Comecemos, porém, pelas visões menos otimistas – oferecidas por Adriano Laureno e Sandro Maskio. Para o primeiro, o próximo ano trará importantes ventos favoráveis vindos da onda de implementação da tecnologia 5G e das modernizações trazidas pelo Marco Legal do Gás – bem como, é claro, a partir dos benefícios trazidos pelo avanço do Brasil em seu calendário de vacinações contra a covid-19.
A despeito de tudo isso, porém, Laureno vê a falta de coordenação entre a política fiscal do governo e a política monetária do Banco Central (BC) como determinante para a um cenário de deterioração da força de recuperação econômica do Brasil. “Enquanto o governo tem afrouxado as restrições fiscais para aumentar o gasto público em uma postura expansionista, o BC tem reagido e aumentado as taxas de juros de maneira agressiva como antídoto para essa postura a fim de conter a inflação” contextualiza Laureno.
“O efeito desse assincronismo deve ser um cenário de estagnação em razão dos juros mais altos, agravado por um movimento crescente da dívida pública causado pela expansão dos gastos. Ou seja, nem vamos impulsionar o consumo e nem frear a inflação”, complementa o especialista. Sandro Maskio, por sua vez, compartilha as mesmas preocupações do colega – acrescentando o esperado efeito de ‘compasso de espera’ gerado pelas eleições como um agravante para o ambiente econômico em 2022. Para o professor da Universidade Metodista, o descontrole da inflação, o arrefecimento da força de consumo e a espera do mercado pelo resultado eleitoral formam uma espécie de freio para qualquer movimento de aceleração que ensaie um crescimento econômico. Algo que, no fim, desemboca naquele que, para ele, é o problema central da crise brasileira: o alto índice de desemprego. “A gente tem um desemprego muito alto. O que leva à melhora do emprego é o crescimento econômico, não existe nenhuma outra mágica que resolva essa questão. Se conseguirmos não piorar no ano que vem – digo isso em função das disputas políticas e do cenário de desafios nos ambientes interno e externo – já vamos dar um primeiro passo rumo à recuperação em um segundo momento”.
POSITIVO
Por outro lado, o conselheiro da ACSP, Alessandro Anzzonni, prefere abordar as perspectivas para 2022 pela ótica do copo meio cheio. Para fazê-lo, o economista não ignorou os imensos desafios trazidos pelo cenário conjuntural do país, mas destacou a força das empresas brasileiras para superarem as barreiras em uma espécie de ‘nado contra a maré’. “As empresas, sobretudo as grandes do varejo, estão capitalizadas e, independentemente do cenário econômico, vão investir buscando o consumidor. Vai vir muita expansão e eu acredito em um crescimento autônomo das empresas – elas não irão esperar o cenário econômico ficar favorável”, projeta Anzzoni.
Segundo ele, este ‘crescimento autônomo’ da iniciativa privada pode, inclusive, ser suficiente para ao menos minimizar os problemas macroeconômicos que hoje assolam o ambiente interno. “Eu vejo a força da iniciativa privada como algo muito positivo para os postos de trabalho e também para o aquecimento da economia em geral. Em resumo, penso que não vamos ter um crescimento muito significativo para o ano que vem – estamos prevendo 2 a 2,5% para o PIB –, mas já é um cenário positivo”, conclui o conselheiro da ACSP.
Famosa ‘resiliência’ do setor respalda otimismo das indústrias de autopeças
Entre a linha que aponta para desafios conjunturais quase intransponíveis e aquela que crê na força da iniciativa privada para crescer a despeito do freio macroeconômico, as empresas ligadas à reposição automotiva preferem ficar com a segunda. Essa confiança na tão argumentada ‘resiliência’ do setor e nos processos internos foi destacada nas entrelinhas por executivos ouvidos pelo Novo Varejo e tem como mote principal suas observações práticas sobre o comportamento do Aftermarket Automotivo de 2020 para cá. Veja o que essas lideranças esperam de 2022
“O aftermarket não teve problemas nas últimas crises que a gente passou e essa pandemia foi uma grande surpresa. Tivemos uma queda durante três meses no ano de 2020, mas felizmente houve uma excelente recuperação já no segundo semestre do ano passado e 2021 foi muito bom, todos os meses com vendas acima da nossa expectativa. E 2022 vai seguir no mesmo ritmo, com dois dígitos de crescimento. Temos produtos sendo lançados, continuamos atuando forte na América do Sul, independentemente da pandemia, sempre lançando produtos e treinamentos. Estamos usando influencers para fazer com que nossas marcas continuem crescendo. As expectativas são boas e 2022 vai ser, com certeza, um ano de bastante crescimento como foram os últimos dois anos”. Rubens Campos – Vice-Presidente Sênior Aftermarket Automotivo Schaeffler América do Sul
“As nossas expectativas são as melhores, em todos os aspectos – eu vou fazer uma isenção do ambiente político, em que a gente não interfere. Mas, economicamente falando e no mercado de reposição, a Schadek está planejando crescer, fazer ampliações de produção e investimentos. Nós trabalhamos com dois dígitos de crescimento. Será um ano de ouro, como foi 2021”. Marcelo Pereira Sergio – Diretor-geral da Schadek
“A Viemar tem excelentes perspectivas para o ano de 2022. Nós projetamos um crescimento que já vem acontecendo nesses ciclos de 2020 e 2021. Obviamente foram ciclos de muitos desafios, dado tudo o que aconteceu na pandemia. Mas a Viemar se consolidou como a solução do mercado nacional e, inclusive, ganhou bastante expressão na América Latina. O ciclo de 2022 vai nos proporcionar uma relevância, no nosso entendimento, ainda maior da marca, uma vez que a gente tem algumas novidades para oferecer ao mercado, sempre com esse olhar, o olhar de ser solução e buscando reconhecimento através das nossas melhores práticas e qualidade”. José Inácio Salis – Diretor Comercial da Viemar
“Nossa expectativa é que 2022 vai ser um ano melhor que 2021; mas um ano de muito trabalho, em que cada vez mais o serviço terá um peso grande junto ao produto. É no que a gente está trabalhando: oferecer o melhor serviço atrelado ao nosso produto. E 2022 vai ser melhor!”. Plinio Fazol – Gerente de Marketing da Tecfil