Na era do 'varejo de experiência', empresas ainda têm dificuldades de cumprir os direitos básicos do consumidor -

Na era do ‘varejo de experiência’, empresas ainda têm dificuldades de cumprir os direitos básicos do consumidor

De acordo com pesquisa do Idec, 67% dos brasileiros já se sentiram desrespeitados na hora de adquirir produtos ou serviços

Lucas Torres

[email protected]

A temática da experiência do consumidor tem, nos últimos anos, ocupado posição central em diferentes fóruns e discussões sobre pilares do varejo mundial na contemporaneidade.

Dentro deste contexto, questões como a diminuição do atrito nas formas de pagamento e personalização do atendimento recebem ênfase por especialistas, que as colocam como legítimos diferenciais na disputa entre empresas do setor pelo consumidores, bem como na transformação destes últimos em clientes assíduos a partir da fidelização.

Uma pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) em fevereiro deste ano mostrou, no entanto, que o varejo brasileiro ainda se encontra em um estágio embrionário no âmbito da boa experiência de compra, pecando em elementos básicos da relação com sua clientela.

No estudo denominado ‘Conhecimento e valorização dos direitos do consumidor’, que entrevistou 1140 cidadãos espalhados por 436 cidades brasileiras em todas as unidades da federação, 67% dos participantes afirmaram já terem sentido seus direitos de consumidor desrespeitados na hora de adquirir produtos ou serviços.

Além de medir o nível de satisfação do consumidor em relação ao atendimento de seus direitos por parte das empresas locais, a pesquisa investigou quais são os pontos que geram maior incômodo no momento.

Para 19% daqueles que afirmaram terem se sentido desrespeitados diversas ou algumas vezes, a dificuldade de cancelar um serviço ou devolver/trocar um produto é a principal queixa.

A cobrança indevida a partir do aumento do preço previamente acordado vem na sequência, tendo sido mencionada por 17% dos insatisfeitos.

Com relação direta ao aumento das vendas realizadas de maneira remota, a entrega de produto danificado, estragado ou alterado – ‘totalmente diferente do anunciado no ambiente digital’ – fecha o pódio dos incômodos com 15% dos apontamentos.

Em suma, o que os dados da pesquisa realizada pelo Idec revelam é que, antes de buscar oferecer maneiras inovadoras de melhorar a experiência de compra, os setores de varejo e serviços do Brasil têm de, primeiro, solucionar gargalos essenciais na relação com o consumidor.

Isso porque, mais do que deixar de cativar e ‘apaixonar’ um cliente – como objetivam táticas do varejo de experiência –, o desrespeito aos direitos básicos gera uma série de efeitos negativos no consumidor, efeitos estes capazes de criar uma rede de má reputação do estabelecimento, seja a nível local (no caso de pequenos negócios), nacional ou internacional.

Esse potencial efeito-devastador do descumprimento dos preceitos básicos constantes no Código de Defesa do Consumidor (CDC) se reflete nas reações mencionadas pelos participantes da pesquisa ao serem questionados sobre o que sentiram ao terem seus direitos desrespeitados:

70% dos respondentes afirmaram terem sido acometidos por um sentimento de revolta. Outros 61% se sentiram ‘enganados’, enquanto 69% relacionaram a situação ao sentimento de ofensa e irritação.

Respeito ao direito do consumidor decresce durante a pandemia e aumento da relevância do e-commerce exigirá novos esforços de regulação

O momento de instabilidade emocional generalizada e o surgimento de novos desafios operacionais trazidos pela pandemia da covid 19 agravou, na opinião de 64% dos entrevistados, o cenário já existente de desrespeito aos direitos básicos do consumidor brasileiro.

De acordo com a especialista em direito empresarial, direito do consumidor e consultora legislativa do Senado Federal, Beatriz Simas, a maior incidência no descumprimento integral do CDC encontrou amparo em ajustes momentâneos na legislação para facilitar a adaptação dos negócios ao cenário de distanciamento.

“Houve uma supressão de garantias ao consumidor, justificada por uma preocupação maior: manter cadeias logísticas em funcionamento durante a fase de lockdown, ao mesmo tempo em que era necessário promover práticas de distanciamento social a fim de reduzir as taxas de contágio e minimizar os riscos para os trabalhadores que permaneciam em serviço presencial”, afirmou Beatriz.

Dentre as medidas adotadas neste contexto excepcional de pandemia, a consultora legislativa do Senado destacou a Lei 14.010/2020, que suspendeu a aplicação do art. 49 do Código de Defesa do Consumidor na hipótese de entrega domiciliar de produtos perecíveis ou de consumo imediato e de medicamentos.

Na prática, a nova lei suspendeu o direito de o consumidor desistir da compra no prazo de sete dias contados a partir da assinatura do contrato ou do ato de recebimento do produto ou serviço sempre que a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial, como, por exemplo, nas hipóteses de vendas por telefone ou a domicílio.

Ainda segundo Beatriz, o impacto da crise sanitária no mercado de consumo, sobretudo no que diz respeito à elevação da relevância das vendas do e-commerce no varejo, exigirá de legisladores do mundo inteiro um esforço contínuo para a atualização do CDC a fim de adapta-lo às novas necessidades dos consumidores.

“Quando se trata da regulação do comércio eletrônico – e em linha com o debate que também ocorre no plano internacional – adquirem relevo propostas que possam aumentar a confiança dos consumidores nos mercados online e também melhorar a segurança, ajudando a combater toda sorte de esquemas de fraudes”, analisou, antes de concluir: “O debate em torno do comércio eletrônico deve continuar relevante, especialmente considerando que certas mudanças de hábitos adquiridas ao longo da pandemia, como um maior uso dos serviços de entrega em casa, podem vir a se tornar permanentes e que muitos pequenos negócios migraram para as plataformas online ou têm no comércio eletrônico hoje uma fonte indispensável de receita.


Notícias Relacionadas
Read More

Reed Exhibitions coloca no ar Link Fenatran

Com a ferramenta, a empresa espera impactar mais de 10 milhões de pessoas por ano ao promover eventos com oferta de conteúdo, interatividades com as marcas e auxílio entre os atores do mercado de veículos comerciais, transformando o ambiente digital em rodadas de negócios.