O papel do marketing no varejo de autopeças -

O papel do marketing no varejo de autopeças

Arquiteto, designer e professor universitário, Luciano Urizzi fala com conhecimento de causa sobre a aplicação prática da disciplina no dia a dia das lojas

 Por Lucas Torres ([email protected])

O sucesso e o crescimento de uma loja de autopeças estão quase sempre ancorados no investimento em áreas que possam proporcionar vantagens competitivas em relação aos concorrentes, bem como estreitar a relação com o consumidor.

Em um ambiente de alta competitividade entre varejos que dificilmente conseguem se diferenciar pelo produto, fica a cargo do departamento de marketing realizar ações e planejamentos que possam diferenciar a empresa segundo a percepção do cliente.

Nesse sentido, contar com profissionais que transcendam o papel de ‘executores’ para cooperar com a diretoria na implementação do planejamento estratégico de forma multidimensional acaba se tornando valioso.

Foi buscando esse perfil que a Dispemec – loja situada em São José dos Campos (SP) – contratou o arquiteto, designer e professor universitário Luciano Urizzi, cuja função é oferecer aos colaboradores uma visão holística dos ideais da corporação a fim de que suas ações resultem em uma percepção positiva da identidade da empresa junto aos mais diversos públicos estratégicos.

A fim de absorver pontos importantes da percepção de Urizzi sobre a importância do marketing no varejo de autopeças, bem como discutir questões mais técnicas da área que possam oferecer insights para nossos leitores, o Novo Varejo traz uma entrevista com o profissional que, entre outras conquistas, foi vencedor do prêmio Profissionais do Ano promovido pela Rede Globo de Televisão.

Novo Varejo – Qual a importância de uma estratégia integrada de marketing para o varejo? Como ela pode solidificar a identidade, a visão e os valores da empresa junto aos próprios funcionários?

Luciano Urizzi – Qualquer organização, seja de grande, pequeno ou médio porte, deve seguir um programa sistêmico de ações previamente desenvolvidas para que possa atender todas as suas necessidades comerciais ou institucionais. No caso da Dispemec, todo o planejamento é desenvolvido no fim de cada ano para que possa ser implementado no ano seguinte. Dentro deste planejamento estão contempladas as ações de caráter interno (endomarketing), promocional, institucional, de conteúdos e social. Qualquer ação de marketing deve estar alinhada ao pensamento da empresa, ou seja, ao seu plano de negócios. Só assim é possível construir uma percepção positiva da identidade da empresa e sua essência.

 

NV – As ações de marketing no varejo de autopeças muitas vezes dependem de parcerias com distribuidores e indústrias. Como está o cenário hoje? É possível, e vale a pena, desenvolver ações com mais independência?

LU – Cada ação tem um objetivo específico. Se usarmos como exemplo uma ação de caráter social (muito presente na postura da Dispemec) é possível identificarmos um comportamento de total independência. Mas, se considerarmos uma ação promocional, uma parceria bem acertada com fabricantes muitas vezes permite ofertar um produto ou executar uma ação de marketing mais viável para o consumidor final. Na Dispemec existe um plano anual, que chamamos de Mídia Kit, em que sempre oferecemos aos parceiros a inclusão de suas marcas em nosso plano de ação, de modo que se fortaleça a relação com o consumidor.

 

NV – Como sua formação inicial, em arquitetura e design gráfico, contribuiu para sua atuação na área de marketing de varejo de autopeças? Você utiliza algumas das ferramentas do design thinking no dia a dia da Dispemec?

LU – Quando era mais jovem, não conseguia imaginar uma conexão entre as áreas de arquitetura, design gráfico e publicidade. Hoje, entendo que minha experiência nestas competências contribui de forma absoluta no programa de ações de comunicação da empresa. Exemplo: numa ação de marketing de eventos, tenho total competência para desenvolver um projeto de ambientação para um estande (incluindo mobiliário) e, além disso, criar as peças gráficas que serão utilizadas na comunicação. Atualmente, entendo que o profissional que possui várias competências tem mais chances de tomar as decisões mais assertivas e também delegar atribuições com mais qualidade.

No meu modo de ver, o design thinking é mais eficiente para empresas prestadoras de serviços. De certo modo, quando estávamos desenvolvendo o novo posicionamento da marca Dispemec, até utilizamos algumas ferramentas do design thinking, mas de uma forma ainda muito tímida.

 

NV – O segmento de varejo de autopeças está devidamente inserido na cultura do marketing como ferramenta de solidificação da cultura e fidelização de clientes?

LU – Vivemos um período de incertezas. O país ainda está muito retraído, com tantos acontecimentos que abalaram todas as áreas do comércio e indústria. Neste contexto, o varejo de autopeças também vem sofrendo nos últimos anos. O segmento tem a característica de procura pelo melhor preço, ou seja, não há uma conduta de fidelização por parte do seu público-alvo. Então, a estratégia é fomentar a lembrança de marca. Precisou de uma peça automotiva? Tem que lembrar da Dispemec. Neste sentido, estamos a cada dia ampliando essa percepção positiva. Sempre tem uma novidade acontecendo, seja por meio de uma certificação internacional, seja através de uma ação solidária, seja na constante melhoria das nossas estruturas físicas.

 

NV – Quais são os principais erros e acertos dos empresários de autopeças que se propõem a implementar o marketing em suas lojas?

LU – O marketing não é uma receita de bolo que deve ser seguida. Cada empresa tem uma realidade diferente da outra. O que pode ser viável para a Dispemec, pode não ser interessante para outra empresa do mesmo segmento. Elementos como localização, relacionamento com os clientes mecânicos, logística de entrega, política de preços, personalização no atendimento são atributos que não se consegue copiar. A meu ver, este é um dos principais erros. Quer acertar? Ouça o seu cliente! Ele tem muito a dizer.

 

NV – O quanto do marketing da Dispemec é embasado nas ferramentas digitais – como as redes sociais, por exemplo?

LU – Não dá pra negar que a mídia digital é uma das estratégias mais importantes nos tempos atuais. Isso também se aplica ao setor de autopeças. É claro que é o tipo de negócio em que não se consegue uma conexão tão imediata com o público. A estratégia é trazer conteúdo relevante dentro do universo dos apaixonados por carros. Foi por este motivo que a Dispemec adotou a estratégica de criar um canal no YouTube chamado Mecânica Fácil, voltado exclusivamente para conteúdos. Ali nada se vende, apenas apresentamos dicas e tiramos dúvidas dos seguidores. Atualmente, o canal já ultrapassou a faixa dos 60.000 seguidores, o que comprova a força da comunicação digital.

 

NV – Com que perspectiva a empresa trabalha para o comércio eletrônico de autopeças? Ele concorre, substitui ou complementa a atuação das lojas físicas tradicionais?

LU – Fazendo um comparativo com o nosso mundo de autopeças, uma loja virtual é como um carro movido a álcool: demora pra pegar. Mas é imprescindível a sua existência. Até pode parecer que é uma ação de vendas que concorre com as lojas físicas, mas não é verdade. Um e-commerce consegue atingir uma área muito maior de vendas. Para se ter uma ideia, já vendemos peças até para a região de Manaus. O mais importante é ter uma logística muito bem acertada para não frustrar o consumidor.

 

NV – A realidade dos varejos de autopeças às vezes não permite a formação de uma equipe robusta para a área de marketing. Nesse sentido, consultores que trabalhem de maneira remota para mais de uma loja podem ser uma solução viável?

LU – De fato, a Dispemec é uma empresa que tem um time robusto à sua disposição. Além da minha consultoria de marketing e comunicação, contamos também com a expertise da Frase, empresa especializada em marketing de conteúdos, com a Eleva Consulting, que nos auxilia nas plataformas digitais e a ProImagem, empresa especializada em marketing de eventos. Todos trabalham em total sintonia, caminhando juntos na mesma direção. Essa é a verdadeira forma de se aplicar o Branding na empresa. No caso de uma empresa que não tem condições de bancar toda essa estrutura de consultoria, acredito que o ideal é ter consigo apenas uma empresa ou um consultor que possa desenvolver um plano de ação customizado. Não acredito em assessoria remota porque é necessário “sentir” o ambiente em que se trabalha. Vivenciar o dia a dia no balcão é o termômetro que nos aponta os rumos a serem seguidos.

 

NV – O setor terciário e o varejo em particular têm se consolidado como elementos-chave da economia nacional – enquanto a indústria como um todo passa por um momento de dificuldade. Quanto este cenário tem impactado as ambições de carreira dos seus alunos? O varejo é visto como um campo de atuação cada vez mais viável para esses profissionais?

LU – Temos que entender que o aluno, de um modo geral, ingressa muito imaturo numa universidade. Quando faz a opção pelo curso de propaganda ou marketing, não sabe ao certo como vai atuar após sua conclusão. O que percebo é uma forte tendência para o empreendedorismo. Já foi o tempo em que os jovens queriam bons cargos em empresas de grande porte. Hoje, querem ter o próprio negócio e gerir conforme sua própria identidade. Partindo desse raciocínio, é mais comum que estes jovens sejam prestadores de serviços do que empresários do varejo.


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