Para economista da FecomercioSP, 2026 será um ano de cautela para o varejo -

Para economista da FecomercioSP, 2026 será um ano de cautela para o varejo

Segundo Thiago Carvalho, conjuntura econômica demandará atenção dobrada em áreas como, por exemplo, a gestão de estoque

O ano de 2025 começou com previsões pessimistas para o varejo brasileiro. Conforme avançamos no calendário, porém, o setor mostrou sua resiliência e acumulou resultados positivos. No primeiro trimestre, por exemplo, as vendas no varejo ampliado cresceram 1,8% em relação aos últimos três meses de 2024. A mesma pujança, no entanto, não prosseguiu no decorrer do exercício e, já no segundo trimestre, o setor teve um crescimento de apenas 0,1% no comparativo com o início do ano.

Para os especialistas, a leitura dos resultados não foi nada fácil. Afinal, a conjuntura econômica nacional misturou índices que justificaram o desempenho mais positivo, tal como os bons índices de emprego do país, com indicadores que, em tese, jogaram contra o setor –tal como a taxa básica de juros que, ao atingir o patamar de 15% ao ano, encareceu o acesso ao crédito tanto para o consumidor quanto para o empresariado.

A fim de entender toda a complexidade deste cenário, bem como projetar os próximos passos do setor ao longo de 2026, entrevistamos com exclusividade o assessor econômico da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), Thiago Carvalho.

Na conversa, o economista sugeriu cautela na tomada de crédito, atenção redobrada à gestão de estoques e preparação para um ano de desaceleração econômica, especialmente para os segmentos mais dependentes de financiamento. Confira abaixo a íntegra da conversa e se prepare para o novo ano!

Novo Varejo Automotivo – Muita gente tem considerado surpreendente o desempenho do Varejo em 2025, já que analistas projetavam queda no setor. Na sua visão, o resultado positivo foi mesmo uma surpresa? O que motivou esse quadro inesperado?

Thiago Carvalho – Desde o processo de “volta à normalidade” pós-pandemia, o varejo paulista registrou taxas de crescimento acelerado em várias regiões do Estado. Apenas para se ter uma ideia, o faturamento do Comércio varejista cresceu 10,2% em 2021, 8,1% em 2022, 4,8% em 2023 e 9,3% no ano passado. Diante dessa forte base de comparação, era esperado um resultado bem menor em 2025 — e, nesse sentido, podemos dizer que o desempenho surpreendeu positivamente, muito por causa do mercado de trabalho aquecido. O aumento da renda, o desemprego nas mínimas históricas e a geração de empregos com carteira assinada aumentam o contingente de pessoas com capacidade de consumir, beneficiando o varejo. Entretanto, vale ressaltar que o desempenho positivo do setor neste ano está muito baseado no primeiro semestre. O segundo é de desaceleração e até mesmo de queda nas vendas para alguns segmentos, principalmente para os que comercializam bens duráveis, como veículos, materiais de construção e autopeças e acessórios. Além da forte base de comparação, o crédito mais caro acaba impactando negativamente as vendas. As vendas do varejo paulista cresceram 9% no primeiro trimestre, 7% no segundo, 2% no terceiro e a expectativa é que fique em 2% no último, fechando o ano com um crescimento por volta de 5%. Portanto, há uma evidente desaceleração.

Novo Varejo Automotivo – Em 2026, teremos forças “puxando” o consumo para lados opostos. De um lado, um cenário de pleno emprego registrado pelas pesquisas. Do outro, o altíssimo endividamento das famílias, que tem batido recordes neste último trimestre. Qual dessas duas variáveis deve ter maior influência no desempenho do comércio do ano que vem?

Thiago Carvalho – O mercado de trabalho, sem dúvidas, foi um dos principais impulsionadores do consumo nos últimos anos, mas já há sinais de desaceleração, em consonância com os outros indicadores econômicos, como o IBC-BR e o próprio PIB [Produto Interno Bruto], divulgado recentemente. Nesse sentido, a expectativa é desaceleração para 2026 e, até mesmo, queda para alguns segmentos. O quadro de juros elevados permanece, com a Selic em 15%, maior patamar em 20 anos. A inflação só voltou a ficar abaixo do teto da meta em novembro, enquanto a inadimplência das famílias voltou a subir — e esses fatores devem prevalecer, surtindo efeitos negativos sobre as vendas, pelo menos no início do ano. Embora o mercado espere queda da taxa básica de juros em breve, é importante mencionar que a inflação dos serviços segue alta e qualquer choque em preços de alimentos, combustíveis, entre outros, fará com que a inflação ultrapasse novamente o teto da meta. Por isso a maior prudência do Banco Central na condução da política monetária.

Novo Varejo Automotivo – Quais segmentos do varejo devem ter melhores números em 2026? Quais perfis devem sofrer mais?

Thiago Carvalho – A expectativa é que os segmentos que comercializam bens duráveis sofram mais. Veículos, eletrodomésticos, eletrônicos e materiais de construção são itens de maior valor agregado em que a compra normalmente depende de crédito e parcelamento. Com os juros elevados e uma postura mais cautelosa do consumidor frente aos desafios da economia brasileira, essas atividades devem sofrer mais em comparação com o de bens essenciais, como supermercados, farmácias e perfumarias etc.

Novo Varejo Automotivo – O clima de insegurança que quase sempre é gerado pelas eleições pode indicar um consumidor mais cauteloso em 2026?

Thiago Carvalho – Sim, as incertezas em relação às eleições e sobre qual será a política econômica a ser adotada pelo governo geram preocupações e tornam o consumidor mais cauteloso. Há um evidente problema fiscal a ser enfrentado e o consumidor está atento a esse cenário e quais as consequências. Além dos juros altos, esse é mais um fator que acaba prejudicando as vendas de bens duráveis, ou seja, diante da dúvida, o consumidor prefere não comprometer a sua renda por vários meses, preferindo aguardar um momento mais seguro.

Novo Varejo Automotivo – Nos últimos meses, ganham espaço os meios de pagamento voltados para tornar o parcelamento no varejo mais acessível aos mais de 60 milhões de consumidores que não têm a possibilidade de utilizar o cartão de crédito. E, no ano que vem, a tendência é que o PIX Parcelado do BC surja como mais uma opção nesse sentido. Como esse quadro pode influenciar o consumo no País em 2026 e ao longo dos próximos anos?

Thiago Carvalho – Os meios de pagamento e as possibilidades de parcelamento e financiamento têm a sua importância na decisão de compra, mas aspectos como renda, emprego e níveis de endividamento e confiança acabam pesando mais na tomada de decisão. Esses são os fatores que determinam o ritmo de consumo.

Novo Varejo Automotivo – O BC tem sinalizado um possível início de queda de juros no próximo ano. Isso poderia influenciar positivamente o comportamento do consumidor na ponta? Quais segmentos do varejo seriam mais beneficiados?

Thiago Carvalho – Na verdade, o mercado sinaliza uma possível queda no início de 2026. O BC vem mantendo a prudência, indicando em seus comunicados que a taxa de juros ainda permanecerá elevada por um período prolongado para trazer a inflação — que, como comentei, só voltou a ficar abaixo do teto da meta em novembro — de volta ao escopo de 3%. Além disso, embora existam sinais de desaceleração da economia, a inflação dos serviços segue alta, girando em torno de 6%. Isso impede uma queda da taxa Selic neste momento. Essa inflação está diretamente ligada à alta demanda e ao mercado de trabalho aquecido. Caso o BC antecipe o ciclo de queda da Selic, há o risco de ter que voltar a subir os juros, afetando a credibilidade do órgão. Se o ciclo de queda da taxa de juros se iniciar, haverá efeito positivo sobre a confiança do consumidor. Entretanto, existe uma defasagem de tempo até que o público sinta o crédito mais barato na ponta. Juros mais baixos e crédito mais barato acabam incentivando o segmento de bens duráveis.

Novo Varejo Automotivo – Pensando em 2026, que conselho você daria aos varejistas brasileiros?

Thiago Carvalho – Em períodos de juros elevados, é fundamental fazer uma boa gestão dos estoques. Estoque parado significa dinheiro parado e acaba prejudicando o fluxo de caixa de empresa. Nesse contexto, essa é uma das principais dicas. Ademais, considerando a desaceleração econômica, é importante adotar uma certa dose de cautela na realização de investimentos — seja em ampliação física, seja em reformas —, inclusive na contratação de funcionários, já que se a desaceleração for mais intensa que o esperado, será preciso reduzir o quadro na sequência, gerando custos. O ano de 2026 será desafiador e o empresário precisa estar preparado e atento a isso.

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