Reforma tributária pode aumentar PIB potencial do Brasil em até 12 pontos percentuais -

Reforma tributária pode aumentar PIB potencial do Brasil em até 12 pontos percentuais

O atual sistema de cobrança do imposto sobre o consumo na origem, que tem efeito cumulativo, reduz o PIB potencial de 4 a 5 pontos percentuais.

A reforma tributária poderá aumentar o PIB potencial do Brasil em 12 pontos percentuais. A estimativa é do secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, que esteve na FEAUSP em 17 de novembro, no debate “Panorama da Reforma Tributária”. Segundo ele, o atual sistema de cobrança do imposto sobre o consumo na origem, que tem efeito cumulativo, reduz o PIB potencial de 4 a 5 pontos percentuais. “Então, estamos perdendo competitividade, tributando investimentos”, alertou.
Mentor do texto da reforma tributária em discussão no Congresso, Bernard Appy fez uma análise detalhada da proposta, as mudanças no sistema tributário brasileiro e os possíveis impactos na estrutura econômica. Através da substituição dos cinco impostos gerais sobre consumo e serviços que temos hoje — PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS — para o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) e um Imposto Seletivo (IS), Appy acredita que a reforma pode aumentar o potencial de crescimento do PIB do país, além de reduzir desigualdades de renda e regionais, tornando o sistema tributário mais justo e eficiente.
“É um avanço enorme em relação ao que temos hoje, as distorções alocativas são eliminadas, a desoneração do investimento é completa, e há uma simplificação em relação ao que temos hoje”, argumentou o economista.
Para Bernard Appy, o Brasil hoje possui o pior sistema de tributos indiretos — os que incidem sobre consumo e serviços — no mundo. “É um sistema extremamente complexo, o que gera custos, trabalho improdutivo e litígio. Quando você tem complexidade você tem muitas possibilidades de interpretação da norma, e isso favorece o litígio”, criticou o secretário. Ele ainda destaca a falta de transparência como um dos problemas desse sistema. “É impossível saber quanto você está pagando de imposto na mercadoria que você está comprando. Tem uma lei que manda publicar uma carga tributada estimada na nota fiscal, posso garantir que aquele número é um chute”.
Uma das razões da ineficácia do sistema atual, segundo Appy, é a tributação realizada na origem, o que incentiva a guerra fiscal, contribui para a ineficiência alocativa e gera impostos no meio da cadeia produtiva que não são recuperados, onerando investimentos e exportações. “Tem estudos que mostram que o efeito da cumulatividade — tributos pagos no meio da cadeia que eu não recupero — sobre o curso do investimento reduz o PIB potencial de 4 a 5 pontos porcentuais. Então estamos perdendo competitividade tributando investimentos”, disse ele.
Para isso, a reforma propõe a adoção do IVA, um imposto não cumulativo sobre o consumo de bens e serviços, cobrado ao longo da cadeia de produção e comercialização. Segundo o secretário, as características de um bom IVA são a base ampla de incidência — sobre toda forma de organização de atividade econômica —, a não cumulatividade plena — todo imposto pago nas etapas anteriores é recuperado —, a tributação no destino — o imposto pertence à jurisdição de destino —, e regras simplificadas.
A proposta é a substituição dos cinco impostos atuais para um modelo chamado de IVA dual, ou seja, dois IVAs com a mesma legislação: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que é federal e compreenderá o PIS, Cofins e IPI, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), dos estados e municípios, substituindo o ICMS e ISS. Além disso, a reforma prevê o Imposto Seletivo (IS), de caráter regulatório, sobre produtos que tenham efeito nocivo à saúde e ao meio ambiente.

Etapas da transição

Bernard Appy acredita que o texto central da reforma tributária será aprovado nas duas casas do Congresso e promulgado ainda neste ano. No momento, a proposta encontra-se na Câmara dos Deputados, depois de sofrer alterações no Senado. Assim que a proposta for aprovada, o sistema tributário brasileiro passará por um período de transição até 2033.
“Nos dois próximos anos [2024 e 2025] vamos trabalhar em leis complementares e desenvolver o modelo de cobrança do novo tributo. 2026 é um período de testes, e 2027 é a transição dos tributos federais. Extingue PIS, Cofins e IPI e cria a CBS e o IS. De 2029 a 32 tem a transição dos tributos estaduais e municipais, vai reduzindo 10% ao ano a alíquota do ICMS e ISS. Todos os benefícios fiscais vão sendo reduzidos simultaneamente, e em 2033 vira a chave e acaba”.
O secretário justificou a transição lenta devido à necessidade de criação de um fundo da União para compensar os investimentos feitos em função de benefícios fiscais. “O período de 2029 a 2032 se dará por razões fiscais. Os benefícios foram legalizados de 2017 até 2032, e tem muito investimento feito com base neles. Segundo a avaliação jurídica, há um risco muito grande de que se fossem reduzidos, mesmo acabando com o ICMS ao longo da transição, as empresas que fizeram investimentos podem argumentar que foram prejudicadas, gerando um passivo fiscal enorme. São benefícios da ordem de 150 bilhões por ano. Um risco fiscal grande”.

Custo político

Apesar da ideia ser uma alíquota padrão, Appy indicou que há exceções de caráter técnico previstas na proposta — os chamados regimes específicos de tributação —, que deverão incidir sobre combustíveis e lubrificantes, serviços financeiros, bens imóveis, planos de saúde, dentre outros.
Além das citadas, foram incluídas outras exceções durante a tramitação no Congresso, dessa vez de caráter político. “Entraram o transporte coletivo de passageiros rodoviário, intermunicipal, interestadual, ferroviário, hidroviário e aéreo, concessão de rodovias, serviços de hotelaria, agências de turismo, parques de diversões, bares e restaurantes, Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs). O problema não é nem tanto se está errado ou não, mas entender como vamos regulamentar tudo isso”, explicou o secretário, que indicou que a mais comum será a redução de 60% da alíquota padrão, válida também para insumos e produtos agropecuários.
Ele ainda lamentou a decisão do Congresso de desonerar a cesta básica ao invés de optar pelo sistema de devolução do imposto para famílias de baixa renda, o cashback. “O consumo pega uma parcela maior da renda das famílias de baixa renda do que das de alta renda, o que seria combatido através da devolução do imposto. O Brasil já tem estrutura para isso. O cashback é muito mais eficiente do ponto de vista distributivo do que desonerar a cesta básica. Em termos absolutos, o rico consome mais produtos de cesta básica que o pobre, então quando eu desonero a cesta básica, eu estou deixando de arrecadar mais da família rica do que da pobre”, explicou Appy, que revelou a possibilidade no Senado de aplicação do cashback nos casos da cesta básica estendida, energia elétrica e gás de cozinha.
Apesar das exceções, o secretário avalia que o custo-benefício da reforma tributária é positivo. “O benefício é muito maior que o custo político da reforma. Em termos de simplificação: se você tem uma complexidade de 100 hoje, você poderia ter uma complexidade de 10 com uma alíquota uniforme, mas vai ter uma de 30 com as exceções incorporadas pelo Congresso Nacional. Existem dois jeitos de olhar para isso: resolveu 70% da complexidade, ou triplicou em relação ao que poderia ser. Mas, certamente, olhando todos os efeitos, é um avanço enorme”, avaliou Bernard Appy.
O evento “Panorama da Reforma Tributária” teve a moderação de Regina Zucchi, consultora tributária. O debate foi promovido pelo Grupo de Estudos em Contabilidade e Tributação da FEA, com a participação dos professores Gustavo Vettori e Fernando Murcia, além de Tatiana Lopes, superintendente geral tributário do Banco Safra, e Lina Santin, especialista em direito tributário.


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