Empresa do grupo Porto Seguro é referência em tecnologia para a reciclagem automotiva e destinação de resíduos
O Brasil ainda dá os primeiros passos na reciclagem de veículos. Poucas empresas têm tecnologia para o desmonte técnico e a destinação dos resíduos extraídos dos automóveis sucateados.
Um case que vem se consolidando no país é a Renova Ecopeças, empresa do grupo Porto Seguro que já processou 6 mil veículos desde o inicio de suas operações, há quatro anos. A empresa impulsiona o segmento com um modelo sustentável e um processo avançado de rastreabilidade das peças, já que a atividade do desmonte hoje está regulada por lei.
Em entrevista ao Novo Varejo, Fabio Frasson, superintendente da Renova Ecopeças, fala sobre os processos de reciclagem e as polêmicas envolvendo a comercialização de itens retirados dos veículos sucateados.
Qual é o objetivo da Renova?
A empresa tem como propósito garantir a destinação ambientalmente correta dos veículos em final de vida útil proporcionando o comércio de itens de reuso para o consumidor final ou atacadista e contribuir para a inclusão social de mão de obra de comunidades carentes. O projeto teve como ponto de partida os altos índices de roubo e furtos de veículos. Chegamos à conclusão que o alto custo dos componentes nas concessionárias estimulava esses crimes. Com base nisso pensamos em oferecer ao consumidor uma peça com origem lícita com garantia, procedência e sendo processada por uma empresa que tem responsabilidade ambiental. É preciso que o consumidor tenha consciência do risco que corre e proporciona à sociedade quando compra produtos sem origem.
Qual é a origem dos veículos processados?
Em sua maioria são veículos sinistrados do grupo Porto Seguro, que compreende a Azul Seguros, a Itaú Seguros e a Própria Porto Seguro. Temos parcerias e contratos com outras empresas seguradoras menores, que talvez não tenham os recursos necessários para montar uma operação de desmontagem como a nossa. Em função disso, a Renova está aberta a processar os veículos dessas outras companhias, porque nosso propósito é sustentabilidade.
A desmontagem de veículos é um assunto polêmico e muitas vezes vista com reservas. Com que argumentos a Renova enfrenta essas resistências?
Essa é uma boa pergunta. Quando a gente começou a montar a empresa, não tínhamos a regulamentação do setor. Queríamos a regulamentação para combater o que é ilegal e separar o joio do trigo. Em 2014, quando saiu a lei do desmanche, a priori a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo proibiu qualquer tipo de comércio de peças de reuso. Fomos digerindo o assunto e percebemos que a determinação tiraria os bons players do mercado. Mas aqueles que vendiam uma peça 100% sem procedência e sempre existiram continuariam atuando. Procuramos conscientizar os órgãos reguladores demonstrando que quem era bandido continuaria no mercado, fosse ele o físico ou digital. A partir daí o governo começou a regulamentar a lei e a Renova começou a se destacar porque tínhamos muita tecnologia. Visitamos Argentina, Estados Unidos, Alemanha, estudamos os cases da Espanha, do Japão e cada um deles tinha um propósito, seja ambiental, seja de comércio de peça de reuso, para combater roubo e furto. A partir de 2014, quando veio a regulamentação no estado de São Paulo e depois, em 2015, no âmbito federal, houve um divisor de águas porque o consumidor e a sociedade começaram a ter mais consciência sobre o risco moral de comprar um produto sem origem.
A lei do desmonte foi resultado de lobby das seguradoras com o objetivo de dar destino aos componentes aproveitados dos veículos sinistrados, de forma que esses produtos acabem representando concorrência predatória com o comércio de peças novas?
Eu lamento que alguns players possam ter essa percepção. O processo é muito mais importante do que os interesses das seguradoras. Para responder a sua pergunta eu vou contextualizar o cenário dos seguros no Brasil: apenas 30% da frota estão segurados. Os outros 70% não têm seguro. E a seguradora hoje, num seguro tradicional, não pode aplicar uma peça de reuso. Todas as peças têm que ser novas, originais ou genuínas, com comprovação de nota fiscal. Mas o fato é que as seguradoras foram consultadas pelas entidades de classe e pelos órgãos regulamentadores, como o Detran. Assim como outros segmentos do mercado, a Anfavea, o Sindipeças, Sincopeças, Sindirepa e outros grandes sindicatos que compõem a cadeia produtiva do automóvel. Formou-se um grupo de trabalho envolvendo todas essas entidades para estudar a melhor forma de implementar a regulamentação. Eu acho que foi um trabalho muito bem feito pelo Governo de São Paulo e, depois, pelo Governo Federal na medida em que foram ouvidos todos esses representantes de classe porque cada um tem seu interesse, mas todos têm o interesse comum de combater o roubo e o furto e minimizar os impactos ambientais da destinação incorreta de veículos em final de vida útil.
Até que ponto as peças de reuso representam uma ameaça à segurança dos usuários do veículo?
Outra excelente pergunta. A regulamentação é muito clara. O que pode ser desmontado? Todo e qualquer veículo com sinistro ou sem sinistro, apreendido ou não apreendido, desde que ele tenha sido baixado, tenha “certidão de óbito” emitida pelo Detran. É exatamente esse o termo: certidão de óbito. Não há autorização para desmontar um carro sem o OK do Detran. Quando você faz um pedido para desmontar um carro, o Detran emite uma cartela com etiquetas que a desmontadora deve colocar em cada peça do veículo para garantir ao consumidor final todo o processo de rastreabilidade, que garante a origem dos componentes. Todas as peças são classificadas: em perfeitas condições, em condições médias ou com avarias estéticas e aquelas peças que são inservíveis. O que é uma peça inservível? Uma peça que não está apta a ser aplicada em função de suas avarias. A peça passa por avaliação técnica de um profissional do Senai ou de um engenheiro, obedecendo a regulamentação. E não podem ser comercializadas as peças ligadas à segurança do veículo, tais como: conjunto de freio, conjuntos de suspensão, conjuntos de airbag, cinto de segurança, caixa de direção, enfim, toda peça relacionada à segurança do veículo deve ser destinada de forma ambientalmente correta, compactada ou devolvida através de remanufatura ao fabricante. Na Renova temos parceria com um fabricante de caixa de direção a quem devolvemos esses componentes para que ele faça o uso que achar correto. Tudo isso está regulamentado e a lei foi elaborada a muitas mãos, incluindo as entidades do mercado. É importante que o consumidor tenha a clareza de que existe uma lei e que as desmontadoras obedecem a essa lei com rigor, não vendendo peças de segurança.
Qual é a perspectiva para o mercado de reciclagem de veículos no Brasil e por que estamos tão atrasados em relação ao primeiro mundo?
O mercado ainda é muito embrionário no Brasil. Segundo o SINDINESFA, do setor de sucata ferrosa e não ferrosa, apenas 1,5% da frota que sai de circulação é reciclada – da que sai de circulação. No Japão, cerca de 8% da frota circulante é reciclada. Quais são os benefícios desse processo? Em países onde a indústria automotiva é madura, quando você compra um carro já paga uma taxa ambiental para a destinação desse veículo. No Japão, um veículo com seis anos de idade já está apto a ser reciclado, mesmo em perfeitas condições. Você deixa ele na desmontadora e recebe um voucher para comprar um carro 0 km com desconto. Isso aquece a indústria. É um modelo econômico benéfico porque incentiva a indústria, a geração de empregos, a circulação de veículos mais seguros e menos poluentes. O Brasil demorou um pouco para ter essa consciência. Faltam incentivos para que a gente chegue num ambiente maduro como, por exemplo, o do Japão. Mas o primeiro passo de homologar o setor de reciclagem já foi dado, um passo importante para chegarmos a um amadurecimento daqui 20 ou 30 anos.
1 AUTOMÓVEL RECICLADO >> – 3.700 kg CO2
( 7 árvores plantadas neutralizam a mesma quantidade de CO2 durante toda a sua vida)
MATERIAL | 1 AUTOMÓVEL RECICLADO -kg CO2 | QUANTIDADE DE ÁRVORES |
Plástico | 142, 14 | 0,27 |
Vidro | 15,14 | 0,03 |
Metal | 1.463,65 | 2,82 |
Alumínio | 2.013,97 | 3,89 |
Tecido | 65,44 | 0,13 |
TOTAL | 3.700,35 | 7,14 |
Fonte: European Comission, DG Enviroment, Waste Management Options e Climate Change: Final Report 2001