Retração do e-commercelevanta discussão sobremodalidade ter alcançadoseu platô -

Retração do e-commerce
levanta discussão sobre
modalidade ter alcançado
seu platô

Especialista em varejo e startups do setor, Marcos Andrade aponta conjuntura e dificuldades com o frete como razões para a queda de 3,2% no último trimestre

Lucas Torres [email protected]

A primeira retração dos números do comércio eletrônico
desde o boom do setor na pandemia levanta uma questão: as
vendas online chegaram a um platô de representatividade no
varejo nacional ou a queda está relacionada a alguma questão
meramente conjuntural?
Pouco mais de 15 dias depois do retorno da edição presencial
do Fórum E-Commerce Brasil, convidamos o especialista em
varejo e conselheiro da assessoria Hand, Marcos Andrade, a
refletir sobre os diversos temas que cercam a desaceleração
da modalidade no país.
No bate-papo, Andrade apontou que o momento de ‘crescimento
automático’ dos mais diversos portes de varejos que se
dispõem a vender online pode ter chegado ao fim e que, com
isso, o momento é de potencializar velhas ferramentas como o
relacionamento personalizado com o cliente.
Embora tenha apontado questões como as dificuldades para
oferecer o frete grátis como obstáculos adicionais ao comércio
eletrônico em relação ao físico, o especialista projetou que
ainda há margem para crescimento do e-commerce no Brasil.
“O pequeno varejo, embora tenha muitos marketplaces
disponíveis, ainda não participa deste universo digital em boa
medida (…). Em razão disso, acredito que o comércio eletrônico
ainda vai crescer bastante”.


Novo Varejo – O Fórum E-Commerce Brasil 2022 foi marcado
pelo público recorde de 18 mil pessoas e um clima repleto
de otimismo. O setor, porém, acaba de registrar sua primeira
queda robusta desde a chegada da pandemia, com retração
de 3,2% no segundo trimestre de 2022 no comparativo com
o mesmo período do ano passado. De que lado você está
nessa história: dos otimistas ou daqueles que acreditam
que o comércio eletrônico pode ter alcançado o seu teto no
varejo brasileiro?
Marcos Andrade
– Te falar qual vai ser o platô, eu não vou
especular. Costumo brincar sobre isso dizendo que, se alguém
te der um número, você aproveita e pede os da loteria, pois

é adivinhação. Analisando potencial, porém, eu vejo que a
representatividade do e-commerce no faturamento total do
varejo ainda deve crescer. Afinal, a gente tem um setor varejista
que ainda precisa caminhar muito rumo à digitalização. O
pequeno varejo, embora haja muitos marketplaces disponíveis,
não participa deste universo digital em boa medida. Eu viajo
muito, temos filial no México, na Colômbia… E em toda a
América Latina temos um cenário parecido: varejos que são
grandes cases e podem estar tranquilamente na 5ª Avenida de
Nova Iorque; e lojas que são muito amadoras. Em razão disso,
acredito que o comércio eletrônico ainda vai crescer bastante.


NV – Sendo assim, a que você atribui essa primeira queda
do e-commerce desde o ‘boom’ ocorrido na pandemia?
Gostaria que você considerasse na sua resposta o fato da
retração relativa das vendas no digital do segundo trimestre
no comparativo anual ter sido mais acentuada do que as do
varejo como um todo.
MA –
Primeiro, temos de considerar a conjuntura altamente
desfavorável. Aqui no Brasil, a gente tem inflação, endividamento,
encarecimento do parcelamento com o aumento dos juros
e todos estes custos. Quando falamos de e-commerce, isso
tudo acaba sendo combinado com um agravante importante:
o aumento significativo das dificuldades para conceder frete
grátis, o que desestimula bastante o consumo online. Vejo
como uma situação conjuntural. Mas é inegável que o segmento
vem sofrendo, e sofrendo bastante. Hoje, a previsão para o
crescimento do e-commerce neste ano gira em torno dos
5%. Uma coisa impensável ante as perspectivas que a gente
tinha. A crença era de que o comércio eletrônico iria seguir
crescendo indefinidamente e não vem sendo assim.


NV – As demissões nas empresas de logística são reflexo
deste mau momento do comércio eletrônico? Pior do que
isso, elas refletem um pessimismo quanto à expectativa
de retomada?
MA –
Sim, isso vem ocorrendo e é natural que ocorra. Há
poucos meses, o setor vinha em um crescimento enorme, de
situações em que havia fila nas lojas de motocicletas motivadas
por motoboys em busca de oportunidade para trabalhar na
entrega de produtos. Essas empresas de logística estavam se
preparando para dar conta da demanda de seus clientes. Aí,
quando a demanda não vem, você tem de ajustar para se manter
eficiente. É isso que a gente está observando. A última a ter de recorrer a cortes foi a Loggi, que demitiu 15% dos funcionários,
cerca de 500 trabalhadores. O que preocupa é que essa é uma
empresa capitalizada, com planejamento. Imagina as outras
empresas, menores e sem este capital… Essas talvez nem
tenham tido demissão porque não têm mais funcionários.
NV – Gostaria de voltar ao início da nossa conversa para
discutir o futuro do comércio eletrônico diante deste
momento de aparente consolidação e desaceleração do
crescimento. Você mencionou os marketplaces como
oportunidades de digitalização para o pequeno. Hoje, com
o dinheiro do consumidor mais escasso, ele ainda é uma
oportunidade viável?
MA –
Eu sou da seguinte mentalidade: pior do que não fazer
o movimento ideal, é ficar parado. Portanto, se só é possível
iniciar uma operação de venda digital a partir do marketplace,
que seja assim. Sabemos, porém, que os pequenos negócios
tendem a perder suas vantagens competitivas quando operam
em um ambiente assim. É preciso pensar estrategicamente
e saber: quando faço uma venda no marketplace, os dados
do cliente são meus ou são da plataforma? Esse é um
ponto crucial, pois o pequeno varejo precisa se valer de sua
capacidade de criar relacionamento com seus clientes.


NV – E por que o relacionamento é tão importante assim para
o pequeno varejista? Isso faz com que sua sobrevivência a
médio e longo prazo esteja atrelada à adoção de CRMs e
outros mecanismos de fidelização?
MA –
Eu costumo brincar que o primeiro CRM é o caderninho de
fiado. Esse varejista sabia todo o comportamento de consumo do
seu cliente, oferecia produtos de acordo com esse conhecimento
e etc. Esse é o relacionamento. Se você não entrega isso, o
cliente vai buscar na Shopper, no delivery do Pão de Açúcar…
Então, é fundamental ser lembrado, usando WhatsApp, que seja.
Vender pelo WhatsApp, entregar de bicicleta… Enfim, encontrar
alternativas. Ou grande vai cooptar este cliente. A boa notícia é
que essas facilidades estão disponíveis. Mas é preciso usá-las,
pois as grandes redes estão estudando formas de replicar este
relacionamento personalizado em grande escala.


NV – Nesta linha de ‘CRM quase improvisado’, apartado
deste mercado das soluções mais avançadas, que dica
você daria para uma loja de autopeças na hora de construir
ou fortalecer uma base de clientes fidelizada a fim de se
resguardar do avanço dos grandes marketplaces e até mesmo das grandes redes?
MA –
A dica é: conheça seu cliente. Se eu te perguntar,
qual é o principal cliente de uma loja de autopeças, você
pode dizer que é o mecânico. Mas, imagino eu, que em
determinada região de uma determinada cidade, o principal
cliente pode ser o consumidor final, o dono do carro. O

varejista precisa saber estes detalhes para oferecer valor
para além do produto. Para mecânicos, é possível oferecer
dicas de fabricantes no WhatsApp, manter esse público
aquecido. Estratégia semelhante, com outra abordagem,
pode ser ofertada para o dono do veículo. O importante é
saber com quem você quer falar e manter este canal aberto
pelos meios possíveis.


Notícias Relacionadas