Seminário da Reposição celebra potencial do mercado brasileiro -

Seminário da Reposição celebra potencial do mercado brasileiro

Edição 2023 abriu espaço para temas do aftermarket automotivo com painéis compostos por formadores de opinião do próprio setor

O Seminário da Reposição Automotiva voltou suas atenções, na edição 2023, para temas relacionados ao próprio dia a dia do mercado brasileiro. O evento foi realizado na tarde de 10 de outubro na sede da FIESP, a Federação das Indústrias do Estados de São Paulo. Em anos anteriores, a prioridade tinha sido trazer exemplos de boas práticas ou ações inovadoras de outros mercados para oferecer referências positivas ao setor automotivo. As discussões da pauta da reposição independente se deram especialmente – mas, não exclusivamente – por meio de três painéis de debates: “Painel das indústrias: as vantagens competitivas da reposição brasileira e seus principais desafios”, “Painel da distribuição: frente às novas tecnologias, quais oportunidades e desafios para a distribuição” e “Painel do varejo: novo perfil do consumidor – quais os desafios para construir uma ótima experiência com o cliente (CX)?”. Todos os encontros foram mediados pelo jornalista Adalberto Piotto. O evento é organizado anualmente pelo Grupo Photon e tem o apoio institucional das principais entidades do aftermarket automotivo brasileiro: Andap, Asdap, Sicap, Sincopeças Brasil, Sindipeças e Sindirepa. Nesta edição, o NovoVarejo inicia a cobertura do Seminário da Reposição Automotiva 2023. Na próxima, encerraremos o assunto com destaque para os três painéis de debates.

CAUTELA

A programação foi aberta por uma apresentação muito bem avaliada do deputado estadual paulista Tomé Abduch. Sob o tema “Perspectivas Econômicas 2024”, o político contou, inicialmente, sua história de empreendedorismo, que começou muito cedo com pequenas obras de reformas em imóveis. Aos 23 anos, ele já tinha 100 colaboradores e hoje é dono de uma das maiores empresas de obras corporativas do Brasil, além de uma loja que comercializa automóveis Porsche. Essa trajetória fez com que Abduch percebesse a importância dos empreendedores para o país, assim como as dificuldades que eles enfrentam, entre elas gestão tributária e obtenção de crédito. Atendendo a um convite do então futuro governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e disposto a fazer algo a mais pelo país, se candidatou a deputado estadual em 2022 e foi eleito com 221 mil votos. “O momento do Brasil hoje é muito delicado. Apesar de uma previsão de crescimento de 3% este ano, o que é muito significativo, é importante ressaltar que, destes, 2% são do agronegócio, resultado das plantações do ano passado. Importante também ressaltar que nos últimos anos nós tivemos um equilíbrio fiscal muito significativo. Desde o governo Temer passamos a trabalhar com teto de gastos. E isso acabou acontecendo ao longo do governo passado, o que trouxe certa segurança das contas públicas. No momento em que assume o novo governo, a gente tem as contas públicas novamente todas totalmente desequilibradas. E aí vou dar um dado: nos governos lá atrás, do PT, algo na casa de 8% acima da inflação eram os gastos públicos. Praticamente nós zeramos ao longo dos últimos governos. A previsão deste ano é na casa de 8% e já estamos 5% acima da inflação. Para o ano que vem, podemos ter mais 8% acima dos 8% deste ano por conta da aprovação que, deve acontecer, do pagamento dos precatórios. Aí eu pergunto: como a gente consegue trabalhar com tranquilidade num país que gasta mais do que arrecada?”, questionou o deputado. Independentemente da qualidade dos dados apresentados, a bem do bom jornalismo é preciso dizer que o deputado é filiado ao Republicanos, partido que compôs a chapa derrotada nas eleições presidenciais de 2022 e, portanto, na grande maioria representa oposição ao partido do presidente da República eleito, ainda que hoje conte com um ministério na atual gestão. Apesar das advertências, Tomé Abduch disse ver com certo otimismo o crescimento do país. “O mercado em que os senhores atuam entendo que será próspero para os próximos anos; mas, ao mesmo tempo, a gente não sabe o que vai vir lá na frente. Pode ser que a gente cresça, pode ser que aconteça alguma coisa, temos que levar em consideração também que há duas guerras acontecendo – por enquanto não percebemos nada significativo em relação ao Brasil. O Brasil pode ser visto como um local para um bom investimento. Mas os Estados Unidos voltaram a crescer e, com o crescimento do consumo lá, as taxas de juros têm previsão de se manter um pouco mais altas. Então, o Brasil deixa de ser aquele país para se colocar o dinheiro, uma vez que há taxas significativas em outros mercados mais seguros. Hoje não é momento de alavancar a empresa. Nós temos grandes varejistas que não vão sobreviver nos próximos anos”.

O deputado paulista levantou dúvidas sobre a possível trajetória de queda da taxa Selic para os próximos meses e exaltou a política austera do Banco Central. “Eu pergunto: como vamos reduzir a Selic sem equilíbrio fiscal? É por isso que dou valor para quem está no Banco Central. Porque não dá para baixar a taxa de juros na canetada. Mesmo quem não é economista entende que, quando você baixa a taxa de juros na canetada, acaba causando inflação e desvalorização da moeda. Então, nosso momento é de muita precaução. Minha sugestão aos senhores: mesmo estando num mercado promissor, mesmo sabendo que nos anos pela frente podemos ter até um vento a favor, tenham cuidado nesse momento que o país passa, mas não percam o otimismo. O Brasil é muito forte, tem empreendedorismo, tem pessoas de bem, que acordam, que têm princípios e valores, a nossa nação é formada por pessoas assim”. Ao final de sua apresentação e incentivado pelos participantes, o deputado Tomé Abduch se comprometeu a abraçar e lutar pelas causas importantes do mercado de reposição como, em especial, a inspeção veicular

Matriz energética diversificada é grande oportunidade para o Brasil

Em sua apresentação no Seminário da Reposição Automotiva, o presidente do Sindipeças, Claudio Sahad, ratificou logo de início a advertência feita pelo palestrante que o antecedeu, o deputado estadual Tomé Abduch. “Estamos passando por um momento de dificuldades, sim. Mas o Brasil tem muitas oportunidades, principalmente no setor automotivo. E essas oportunidades estão extremamente ligadas à diversidade da nossa matriz energética. O país tem hoje a matriz energética mais diversa do planeta, temos todos os modais de produção de energia limpa; se soubermos explorar isso, nossa indústria de transformação vai dar um salto de qualidade. Vamos ter um novo protagonismo no mundo. Para isso, precisamos de união, da indústria participando da formação de políticas industriais para podermos ter um projeto que não seja de governo, mas de estado, e que possa nos levar a esse outro patamar”. O presidente do Sindipeças apresentou dados ricos sobre o cenário e as perspectivas do setor automotivo brasileiro, que você acompanha nas imagens a seguir, acompanhadas pelas considerações feitas por Claudio Sahad.

“Nos últimos anos, a indústria enfrentou o problema da perda de importância no PIB. Em 1985, respondíamos por 36%; em 2005, 14%; e acabamos chegado, em 2022, a 11,7% do PIB. Tivemos uma queda muito significativa na importância da participação industrial, e isso ocorreu por conta da perda de competitividade da nossa indústria. Conquanto as pessoas façam sua lição de casa e são competitivas do portão para dentro, do portão para fora a gente perde competividade por uma série de entraves que existem no caminho e tornam nosso produto mais caro

“O principal problema é o que nós chamamos de Custo Brasil, que na verdade é uma salada de problemas e entraves de toda ordem e que hoje representa 22% do PIB. Ou seja, nós somos um país onde temos que competir com as empresas de fora carregando uma bola de ferro amarrada na perna. É assim que nós entramos na raia para fazer a corrida”

“Temos vários desafios estruturais, precisamos atender a uma série de temas no nosso dia a dia, como indústria 4.0, descarbonização, formas de mobilidade sustentável, novos combustíveis, novos modelos de negócios. Mas também temos oportunidades: hoje se fala em parques industriais verdes e a indústria está voltando às origens. No início dos tempos a indústria dependia do rio, da água para mover seus equipamentos, então ela ficava ao lado do rio. Com o advento do motor a vapor, da energia elétrica, do petróleo, foi se afastando e, agora, vemos uma tendência daquelas empresas que são intensivas em energia voltarem para perto da produção, porque a energia limpa é barata de produzir, mas cara de transportar. E o Brasil, por conta dessa matriz energética, começa a virar um polo atrativo para indústrias do mundo inteiro por causa da energia verde e barata que produz”.

“Da porta para dentro somos competitivos, estamos fazendo a lição de casa. Mas, da porta para fora, temos problemas. Precisamos demais de reformas estruturais como a tributária, que é a mais importante. Temos problemas de segurança jurídica e patrimonial, nossos concorrentes lá fora nem sabem o que é ter um vigia armado na fábrica 24 horas por dia. E o custo de compliance fiscal e tributário, que faz com que você tenha contingentes de pessoas dentro da empresa simplesmente para cumprir obrigações acessórias. Nossos concorrentes lá fora não têm isso. A dificuldade que temos, ainda, para obter financiamento com taxas de juros adequadas, a nossa infraestrutura logística que é muito deficiente e cara. Tudo isso precisa ser melhorado para sermos mais competitivos”.

“Temos hoje uma série de rotas tecnológicas e soluções para descarbonização. A posição do Sindipeças é neutra. Entendemos que as diferentes tecnologias pró-descarbonização vão coexistir no mundo e uma ou outra vai prevalecer em cada região, conforme as suas peculiaridades. O Brasil, que é um país privilegiado pela matriz energética, pode ter todas elas. E já estamos vendo isso acontecer. Vamos ter todas, com aplicações diferentes, o que é muito bom porque nos mantêm inseridos nas cadeias globais de valores, nós podemos fornecer para todo mundo e dar essa opção para os consumidores”.

“Não existe mais interesse em construir motores a combustão nos Estados Unidos, na União Europeia e na China. Mas a gente começa a ver que o motor a combustão ainda tem uma vida muito longa no planeta. Temos uma frota mundial de 1,5 bilhão de veículos. Produzimos 85 milhões por ano. Se nós partíssemos da premissa de que 100% desses veículos fossem elétricos, levaríamos mais ou menos 20 anos para substituir essa frota. Como a gente sabe que cerca de apenas 30% são elétricos, vamos levar 50 anos para essa substituição. Além disso, naqueles países em que a população tem baixo poder aquisitivo, o carro elétrico ainda não é prioridade, vai ser um nicho de mercado, por exemplo no Brasil. Aqui em 2030 não vamos ter mais do que 7% ou 8% da nossa frota elétrica. Isso não vai resolver o problema da descarbonização, então precisamos encontrar soluções paralelas. O Brasil está trabalhando muito forte em outras tecnologias utilizando etanol e temos uma grande oportunidade em liderar essas tecnologias no mundo. Temos competitividade com veículos a combustão com combustíveis de menor pegada de carbono. O inimigo não é a combustão, é o CO2. É preciso entender isso e valorizar aquilo que temos aqui dentro”.

“Se o motor a combustão não vai ser mais produzido nem nos Estados Unidos e nem na Comunidade Europeia, alguém vai ter que produzir para o mundo. Aí surge a oportunidade para o Brasil. Nós estamos desenvolvendo tecnologias pró-descarbonização mas, em paralelo, surge essa oportunidade de o Brasil se tornar um centro mundial de produção e exportação de motores e veículos a combustão. Temos a convicção de que Brasil, Índia, localidades da Ásia, Oriente Médio, África e países da América Latina vão continuar utilizando o motor a combustão por muito tempo e esses povos são potenciais clientes das nossas exportações”.

“É o momento de a indústria se unir e levar para os governos municipais, estaduais e federal as nossas pautas, para que possamos construir juntos políticas industriais que possam aproveitar as oportunidades da nossa matriz energética e, em segundo lugar, dar esse salto de qualidade na nossa indústria de transformação. Esse momento, para o mercado de reposição, também é muito propício porque hoje a produção, tanto de leves quanto de pesados, está menor, porque os caminhões têm o problema do Euro 6, os leves têm o problema dos financiamentos, e as pessoas estão deixando de comprar os novos e indo para os seminovos, o que está movimentando o mercado de reposição. Dentro dessa oportunidade de o Brasil se tornar um hub e fornecer para o mundo, o mercado de reposição vem junto, porque vamos vender motores e caminhões, mas depois as autopeças vêm junto.

Mercado brasileiro precisa e merece ser valorizado

No Brasil, o mercado de reposição automotiva movimenta próximo de 100 bilhões de reais para a economia, sendo 30% em autopeças e 70% em mão de obra, gerando 1 milhão de empregos para atendimento a mais de 78 milhões de motoristas habilitados. Este foi o ponto de partida para a apresentação de Rodrigo Carneiro, presidente da Andap, a Associação Nacional dos Distribuidores de Autopeças. A proposta era abordar a Aliança do Aftermarket, iniciativa surgida para atuar na defesa do setor e estabelecer uma posição clara e eficaz pelo direito de reparar. No en – tanto, impulsionado pelo momento do encontro, o executivo preferiu quebrar o protocolo e falar de improviso. “Eu ainda me emociono ao ver um novo talento político como o deputado que esteve aqui conosco dizendo de forma tão simples e clara qual é, ou deveria ser, o papel de um político. Fico muito sensível ao ir a uma escola técnica média do segmento automotivo, com crianças desafortunadamente à margem econômica, mas recebendo café da manhã, ensino fundamental de primeiríssima qualidade, ensino técnico de primeiríssima qualidade, laboratório de inglês, laboratório de arte, de música, matemática, física, num país chamado Brasil. Isso faz com que ao longo do tempo você se deixe envolver por todos esses temas”. Após destacar a excelente interlocução que o mercado de reposição tem tido atualmente com o Sindipeças, Rodrigo Carneiro abriu mão da apresentação programada para falar sobre as razões de a Aliança do Aftermarket ter sido criada. “Não sabemos valorizar nosso segmento, que é líder inovador em tecnologia no mundo. Há três meses, num evento importante em Brasília – que reunia ministros de estado, secretários de estado, deputados federais, senadores e outros – alguém falou em importar veículos elétricos sem tributação. Isso não faz o menor sentido, o Brasil pode ser um dos maiores centros de competência de produção de motores a combustão de baixa emissão – porque o problema não é a produção de motores a combustão, é a emissão de poluentes. E o Brasil tem tecnologia para evitar isso e contribuir com o mundo. No ano passado, não fomos nós que descobrimos que o Brasil tem o quarto mercado de reposição no mundo e foi preciso uma instituição norte-americana fazer esse levantamento para mostrar isso para todos nós. Então, um dia chamei alguém para conversar sobre minhas angústias e inquietudes com algumas coisas do segmento. Havia mais gente pensando assim e concluímos que era preciso reunir o aftermarket e mostrar para o mundo que entendemos a responsabilidade de sermos o quarto maior mercado do planeta, que entendemos a responsabilidade de sermos desenvolvedores de tecnologia no segmento automotivo, que temos competência para produzir isso” . Rodrigo Carneiro também chamou atenção para as dificuldades para empreender e gerir as empresas no Brasil, mas, mesmo diante delas, as empresas ainda estão atuantes. “O mercado de reposição tem mais de 60 mil pontos de venda de varejo. Mais de 90 mil aplicadores, onde vocês veem isso? E todo dia tem gente empreendendo e inovando neste segmento. E quando se fala em novas tecnologias, como o e-commerce, por exemplo, estaremos fazendo parte do desenvolvimento dessa tecnologia e não apenas acompanhando ou copiando. Às vezes eu não entendia por que tanto interesse externo pelo nosso mercado. É porque eles sabem e dão valor para aquilo que às vezes nós mesmos não damos. Temos orgulho de participar de um movimento global – agora em novembro teremos mais uma reunião em Las Vegas – para defender o Right to Repair. Essa não é uma defesa para aumentar nosso volume de negócios, é para defender o direito do consumidor, ele sim tem o direito de reparar um bem que é dele onde entender ser melhor. É claro que nós temos convicção que todos os repara – dores, os varejistas e distribuidores de autopeças e a indústria estarão capacitados para um programa como esse. Porque nós já nos capacitamos para muito mais. Desenvolvemos tecnologia, por exemplo, de formação, e está aqui o IQA, que tem um trabalho maravilhoso e que talvez a gente não tenha dado até então a dimensão devida e o quanto a gente pode usar no desenvolvimento de funções e de inteligência e capacitação num instituto formado aqui no Brasil. Conseguimos desenvolver nossa própria certificação, tivemos capacidade de desenvolver o Instituto da Qualidade Automotiva. Isso é o mercado brasileiro


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