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Carros nas mãos de frotistas não enfraquecem
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Protagonistas na mudança da configuração do mercado automotivo, locadoras seguem contando com a capilaridade de oficinas e lojas de autopeças independentes pelo país para a manutenção dos veículos

Lucas Torres jornalismo@novomeio.com.br

Você costuma vender autopeças para reparadores que atendem frotistas de automóveis? Essa pergunta, que pode parecer despretensiosa à primeira vista, está se tornando cada vez mais relevante para varejistas e distribuidores de autopeças do aftermarket independente. Vista como tendência mundial já há alguns anos, a transição da propriedade dos veículos – saindo das mãos das pessoas físicas para pertencer às empresas – tem se mostrado agora uma realidade no mercado brasileiro. No Aftermarket Automotivo, este movimento crescente vem sendo tratado como “pejotização” da frota. Um dos maiores exemplos deste cenário está no crescimento exponencial das chamadas ‘vendas diretas’ no país. Em 2013, essa modalidade era responsável por uma fatia de cerca de 23% de todos os carros e comerciais leves zero quilômetro comercializados por aqui. Hoje, a representatividade é de aproximadamente 49%, uma expansão de mais de 100% em uma década.

O que são vendas diretas?

Se encaixam na modalidade conhecida como ‘vendas diretas’ as comercializações de automóveis entre montadoras e empresas; pessoas com deficiência (PcD); taxistas; autoescolas; frotistas; locadoras; e motoristas de transporte escolar, por exemplo.

As locadoras representam um papel de protagonismo neste cenário de transformação. No ano passado, por exemplo, elas foram responsáveis pela compra de um terço do total de automóveis 0km vendidos no país – e, para isso, gastaram o impressionante volume de R$55,2 bilhões na compra de 590.520 carros novos no período.

O investimento em peso das locadoras na ampliação de suas frotas passa diretamente pelo aumento do interesse do consumidor brasileiro pelo modelo de compartilhamento de veículos trocando a posse pelo uso do automóvel. Seja por meio de transporte por aplicativo – cuja locação para motoristas é destino de 52% da frota das locadoras – ou da modalidade conhecida como ‘Carro por Assinatura’ – para onde se destinam 106 mil veículos da frota destas companhias – a visão do carro como serviço e não como propriedade, sobretudo entre as novas gerações, tem sido documentada consistentemente por pesquisas de mercado como a do Serasa, divulgada no início deste ano. A consolidação do primeiro modelo não é novidade e está expres – sa em dados como os do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), que apontam para um crescimento de 979,8% no número de brasileiros que trabalham como motoristas por aplicativo entre 2016 e 2021, o que representa – em números brutos – que cerca de 1,5 milhão de nossos cidadãos que atuam na função. Movimento mais recente no portfólio de compartilhamento de automóveis, o ‘Carro por Assinatura’ chegou ao país em meados de 2019 e, até o final de 2022, mostrou trajetória ascendente, crescendo 37,5% no período. Essa curva de evolução animou não apenas players como locadoras, seguradoras e montadoras de veículos, mas também um mercado de startups voltadas a oferecer serviços de suporte ao consumidor que deseja trocar seu carro próprio por outro locado. Fundada em fevereiro do ano passado, a ComparaCar é um exemplo entre as empresas que surgiram nesta esteira.

Tem como core business um portal que reúne um grande estoque de ofertas de carros por assinatura consolidadas dos maiores por – tais de busca, além de locadoras e fabricantes que oferecem o serviço. A ideia da empresa é ser um ‘Google dos carros por assinatura’, facilitando a busca por parte de clientes interessados. Questionado sobre o que o atraiu nesta modalidade ainda em desenvolvimento no país, o fundador da plataforma, Alan Lewkowicz, mencionou o potencial de crescimento nos próximos anos como o principal fator. “Bom, se considerarmos Estados Unidos e Europa, o carro por assinatura é muito semelhante ao leasing operacional oferecido pelos fabricantes. Era uma modalidade que não existia aqui, principalmente para as pessoas físicas, e lá fora é muito comum, com penetração acima de 50% do mercado. Então, tem um espaço gigantesco para crescimento aqui no Brasil”, analisou o empresário.

E como fica o aftermarket nesta transformação?

A mudança progressiva do perfil dos proprietários dos veículos da frota nacional e a perspectiva de uma acentuação nos próximos anos acende o alerta no aftermarket automotivo. Afinal, a quem locadoras e outros frotistas irão recorrer na hora de fazer a manutenção e o reparo destes veículos? Segundo Paulo Miguel Jr, diretor da ABLA – Associação Brasileira das Locadoras de Automóveis, ao menos no que diz respeito a estas empresas de locação, a resposta para essas demandas seguirá sendo o mercado de reposição. “Nós usamos as oficinas independentes. A manutenção é feita em diversos locais pelo país, já que a frota é muito espalhada. Temos usado bastante o consumo de peças e de mão de obra de estabelecimentos independentes. O número de locadoras que têm mão de obra própria é muito pequeno”, relatou Miguel Jr. Questionado sobre o mesmo cenário, desta vez olhando por um prisma mais amplo do mercado de carros por assinatura, Alan Lewkowicz, da ComparaCar, apontou que o modelo de manutenção varia, a depender se a empresa ofertante é, por exemplo, uma locadora ou uma montadora. “Se forem grandes locadoras, elas têm parcerias tanto com concessionárias quanto com rede credenciada. Tem locadoras com mais de dez mil pontos de atendimento pelo Brasil, por exemplo. Se for um contrato de assinatura de uma montadora, aí sim os serviços serão sempre realizados exclusivamente numa concessionária autorizada”, corroborou o empresário.

Na Europa, avanço dos frotistas já faz parte do planejamento do aftermarket

A expansão do compartilhamento de carros em suas diferentes modalidades e o avanço dos frotistas como detentores da propriedade dos veículos têm impulsionado uma espécie de pivotagem estratégica dos players do aftermarket na União Europeia. Segundo levantamento do Boston Consulting Group (BCG), o mercado de reposição automotiva de países como Alemanha, França, Reino Unido, Holanda e Polônia deve ter 37% de sua demanda advinda de frotistas até o ano de 2030. “O crescimento das frotas vai trazer uma mudança no aftermarket, à medida que elas terão de se relacionar com cada mais consumidores B2B. Isso irá demandar um reposicionamento estratégico das empresas que devem modificar para sempre o setor”, afirmou o BCG, em relatório que repercutiu o estudo. Diante deste cenário, o BCG preparou uma espécie de cartilha voltada a orientar os players do aftermarket a aumentarem suas chances de seguirem relevantes em meio a esta maior participação dos frotistas no aftermarket. A consultoria destacou quatro itens fundamentais:

1) Oferecer um portfólio de produtos específico para carros eletrificados já que, ao menos na Europa, estes modelos possuem uma penetração mais robusta entre frotistas na comparação com as pessoas físicas.

2) Introduzir produtos e serviços com maior foco no controle de custos à medida que os frotistas costumam trabalhar com margens mais apertadas e tendem a fazer uma busca mais cuidadosa no âmbito do custo-benefício.

3) Desenvolver soluções digitais e se preparar para a conectividade ao passo que os frotistas buscam integrar seus automóveis com sistemas baseados na tecnologia da informação a fim de reduzir custos e aumentar a eficiência. 4) Unir forças com outros players do aftermarket. Segundo o BCG, essa maior colaboração entre as empresas do setor é fundamental para criar uma cadeia que entregue um maior valor integrado, fortalecendo duas posições no âmbito dos três itens previamente citados e aumentando seus portfólios de produtos para os frotistas.

Localiza e Unidas se posicionam sobre atual cenário dos carros por assinatura e suas relações com o aftermarket independente

Como você viu até aqui, tanto a participação dos frotistas no controle da frota nacional quanto o crescimento do modelo de carros por assinatura têm recebido impulso majoritariamente pelas grandes locadoras de automóveis. Por isso, para compreender melhor a estratégia destas empresas, convidamos porta-vozes de duas das protagonistas do setor para entrevistas exclusivas a respeito de suas operações e visões de mercado. Venha conosco e saiba o que pensam Localiza e Unidas sobre o cenário atual.

Novo Varejo Automotivo – Como vocês observam o crescimento do modelo de carros por assinatura no Brasil?

Localiza – O segmento de carros por assinatura vem crescendo de maneira sólida, constante e sustentável, e apresenta potencial de expansão tanto em pessoa física quanto para pequenas e médias empresas no Brasil. Recentes estudos mostram que o total de assinaturas deve mais que triplicar nos próximos anos. Esse crescimento se dá em razão da mudança gradual de hábito do consumidor, que tornou a posse menos relevante diante do valor da conveniência, comodidade e economia.

Unidas – Acompanhamos de perto o expressivo crescimento do modelo de carros por assinatura no Brasil e reconhecemos a crescente demanda dos consumidores por soluções de mobilidade flexíveis e acessíveis. Para atender a essa demanda, atualmente disponibilizamos três modalidades de assinatura de veículos: Unidas Livre, que é um modelo de longo prazo voltado para pessoas físicas e uso no dia a dia; Unidas Mensal Mais, com planos de no mínimo 30 dias, também para uso cotidiano, e Unidas Driver, que é um serviço de assinatura específico para motoristas de aplicativo. Essas opções diversificadas permitem que nossos clientes encontrem a solução mais adequada às suas necessidades e preferências.

Novo Varejo Automotivo – Quais classes econômicas são os clientes predominantes de vocês neste modelo?

Localiza – Temos clientes espalhados por todo o país e com mix equilibrado entre PF e PJ. Nota-se maior concentração entre a faixa etária de 36 a 55 anos e nas regiões Sul e Sudeste. Quase 80% dos nossos assinantes são do gênero masculino, com renda acima de 10 salários, sendo 88% com graduação completa e pós-graduação. Fala-se muito que o comportamento de consumo, que prefere o uso em detrimento da posse, é da geração Z, mas os nossos clientes são em maioria da geração X. Talvez porque possuem renda, já tiveram a dor de ter um carro próprio e agora querem o equilíbrio entre comodidade e mobilidade.

Unidas – Nossa oferta diversificada de modalidades de assinatura de veículos nos permite atender às necessidades e preferências de diferentes perfis de clientes, independentemente da sua classe econômica. Buscamos oferecer soluções personalizadas e adaptadas às demandas de cada consumidor, garantindo uma experiência de alta qualidade em todas as faixas econômicas.

Novo Varejo Automotivo – Vocês consideram que o preço atual dos planos ainda é um fator impeditivo para a massificação do modelo no país? Quais fatores poderiam baratear esse custo para o consumidor final?

Localiza – Carro por assinatura é um segmento ainda em construção no país e muitos consumidores ainda têm dúvida sobre esse modelo. Assinar pode custar até 40% mais barato do que financiar um veículo zero quilômetro e 20% menos que adquiri-lo a vista considerando custos com seguro, manutenção, impostos e depreciação.

Unidas – Em nossa análise, não consideramos que o preço dos planos seja um fator impeditivo para a massificação do modelo de carros por assinatura no Brasil. Ao contrário, percebemos que a adesão a este modelo tem aumentado consistentemente, justamente pela proposta de valor que oferece: uma solução de mobilidade completa, que inclui todos os custos relacionados ao uso de um veículo, sem a necessidade de se preocupar com questões como depreciação, manutenção e seguro. É preciso considerar que o valor do serviço incorpora uma série de custos, tais como manutenção preventiva, seguro, licenciamento e IPVA. Também acreditamos que a disseminação do conhecimento sobre as vantagens deste modelo pode contribuir para sua maior adoção. Muitas pessoas ainda não têm plena consciência de todos os custos envolvidos na propriedade de um veículo e, quando passam a entender o valor agregado em nosso serviço, reconhecem o carro por assinatura como uma opção viável e atraente. Contudo, estamos sempre em busca de eficiência operacional e de parcerias estratégicas para oferecer o melhor custo-benefício aos nossos clientes.

Novo Varejo Automotivo – Como vocês realizam a manutenção e a reparação dos automóveis? Por se tratar de carros novos e seminovos, essa manutenção se restringe às concessionárias autorizadas pelas montadoras ou vocês possuem algum acordo com o mercado independente – tanto autopeças quanto oficinas?

Localiza – Os carros dos planos de assinatura Localiza Meoo são zero quilômetro e para manutenção preventiva contamos com a expertise e confiança dos 50 anos da Localiza em gestão de veículos. Tanto que nossos clientes podem contar com uma robusta estrutura de apoio com mais de 670 agências e parceria com mais de 10 mil oficinas espalhadas por todo o país.

Unidas – Sabemos a importância de manter os veículos em perfeitas condições de uso, tanto para carros novos quanto seminovos, e estabelecemos parcerias com uma rede de concessionárias e de oficinas credenciadas em todo o país. Dessa forma, proporcionamos flexibilidade aos clientes na escolha do local onde desejam realizar a manutenção ou reparação de seus automóveis. É importante destacar que a nossa rede de oficinas credenciadas é cuidadosamente selecionada e mantida com critérios rigorosos de qualidade.


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