Nos últimos anos, a forma como o consumidor brasileiro está comprando no varejo vem passando por diversas transformações. Do lado das tecnologias, surgem novos motores de crédito, soluções de pagamento por aproximação e a consolidação do Pix como meio de pagamento dominante. Do lado do comportamento, cresce a busca por agilidade, segurança e facilidade no parcelamento, especialmente por parte de públicos que tradicionalmente ficavam à margem do crédito formal.
Essas mudanças acontecem em um cenário em que o Pix já se consolidou como o método de pagamento mais utilizado no país. No último Dia do Consumidor, por exemplo, 54% dos consumidores declararam preferência pelo Pix, enquanto o cartão de crédito caiu para 28% — uma inversão expressiva em relação ao padrão observado em anos anteriores.
Mas o avanço do Pix vai além da instantaneidade nas transferências. Sua evolução inclui o Pix por aproximação, que elimina etapas no checkout presencial, e o Pix Parcelado, que vem sendo impulsionado por fintechs com motores de análise de crédito baseados em dados alternativos e inteligência artificial.
Ao mesmo tempo, o uso de tecnologia NFC se espalha rapidamente pelos estabelecimentos físicos: segundo o Balanço 2024 da AFRAC – Associação Brasileira de Tecnologia para o Comércio e Serviços, os pagamentos por aproximação movimentaram R$ 1,5 trilhão no ano passado, alta de 48,3% em relação a 2023. Eles já representam 67,2% das transações presenciais com cartões.
Para os especialistas, essa nova infraestrutura de pagamentos representa mais do que comodidade. É um novo capítulo de inclusão financeira, concorrência saudável entre soluções e redução de barreiras tanto para consumidores quanto para lojistas. “O pagamento por aproximação trouxe mais robustez, rapidez e segurança para o consumidor”, afirma o presidente da AFRAC, Edgard de Castro. Em complemento ao dirigente, o CTO & CPO da provedora de soluções financeiras Celcoin, Thiago Zaninotti, destaca que o Pix Parcelado, inserido no cenário do Open Finance, democratiza o acesso ao crédito e representa uma revolução nesse sentido.
Para entender os detalhes dessas mudanças nos meios de pagamento e os impactos dessas transformações no varejo brasileiro atual, conversamos com Edgard de Castro e Thiago Zaninotti sobre os diversos temas que cercam o universo. Confira a seguir a íntegra das entrevistas.
A revolução representada pelas tecnologias de aproximação
Novo Varejo – Como você vê o impacto das novas tecnologias de pagamento no dia a dia do varejo?
Edgard de Castro – A integração dos meios de pagamentos eletrônicos tem sido o grande mote da área de pagamento e ela facilita o processo. Você normalmente vai ter o cartão de crédito, o cartão de débito, o Pix, o voucher… Todos esses meios eletrônicos integrados. E aí a gente já começa a ver os diferenciais que surgem de um em relação ao outro e a competição entre eles. Isso tudo favorece o varejo. Além disso, temos também a real diminuição do pagamento para o consumidor que ocorreu com a entrada da tecnologia de proximidade, o NFC. O que teve resultado direto, inclusive, no aumento do consumo no setor varejista.
Novo Varejo – Por falar em tecnologia de proximidade, recentemente o Banco Central lançou o Pix por aproximação. Quanto ele deve impactar o uso da tecnologia, já amplamente aderida pelos consumidores?
Edgard de Castro – Muito. Afinal, antes dessa novidade cada transação exigia entrar no banco, digitar senha, conferir dados… Enfim, muita fricção. Agora, com o Pix por proximidade, a experiência tende a ser parecida com a do cartão por aproximação. Isso reduz muito o atrito na hora do pagamento e o efeito deve ser o mesmo que mencionei anteriormente, impacto direto no aumento de transações.
Thiago Zaninotti – O Pix por aproximação representa uma evolução significativa na experiência de pagamento no varejo físico. Enquanto no ambiente digital a diferença entre usar Pix ou cartão já era pequena, no mundo físico ainda existia uma fricção: era necessário copiar e colar códigos, acessar o aplicativo bancário e autorizar a transação. Com o Pix por aproximação, eliminamos essa barreira. O processo se torna tão simples quanto usar um cartão – basta cadastrar a sua conta bancária com Pix, dar o consentimento na carteira digital e aproximar o celular. Esta redução de fricção deve impulsionar ainda mais a adoção do Pix em estabelecimentos físicos, beneficiando tanto consumidores quanto lojistas.
Um novo passo na democratização do crédito no varejo
Novo Varejo – Para além da comodidade e redução de fricção, a velocidade e amplitude do acesso ao crédito é algo fundamental quando falamos da relação entre o universo de pagamentos e o setor varejista. Como o Brasil está evoluindo nesse sentido?
Edgard de Castro – Bastante. Hoje, se você tem uma integração via Open Banking ou Open Finance — que é mais completo — o cliente autoriza a transferência de dados bancários para um motor de crédito. Esse motor busca a melhor oferta e já apresenta para o consumidor. Por exemplo, estou numa loja de materiais de construção. A conta deu R$ 50 mil e eu quero parcelar. Então, meu banco manda a aplicação para confirmar uma integração via Open Finance. A partir daí, os dados são enviados e o motor de crédito busca a melhor opção. A partir daí, aparece na tela algo como “A Crefisa oferece em 10 parcelas tal valor”. Então, eu confirmo pelo app do banco e fecho a compra. Esse mecanismo democratizou muito o crédito ali mesmo no PDV.
Novo Varejo – O interessante é que essas integrações também ajudam a reduzir o risco de inadimplência para o varejista, não é?
Edgard de Castro – Exatamente. Na realidade, quem passa a lidar com o problema da inadimplência é o agente financeiro. E esse agente financeiro, óbvio, abre disciplina em várias análises. Ele vai fazer uma análise de crédito, uma série de verificações para rapidamente falar “posso dar ou não esse crédito”. Quem está comprando o risco — e, claro, os lucros disso — é a instituição financeira. É o exemplo da loja de materiais de construção. Se eu tivesse ido lá com uma conta de 50 mil e ele não pudesse parcelar para mim, eu ia embora. Agora, se alguém parcelou para ele, uma instituição financeira parcelou, ele fechou a venda. Mesmo pagando alguns percentuais, compensa.
Novo Varejo – Um dos movimentos que têm surgido no país é o avanço do Pix Parcelado oferecido por fintechs. Você acredita que, somados ao Open Finance, os motores de análise de crédito dessas empresas podem ajudar a democratizar o acesso ao parcelamento no país?
Thiago Zaninotti – Sem dúvida. O Pix Parcelado democratiza o acesso ao crédito e representa uma revolução nesse sentido. O grande diferencial da Celcoin está na infraestrutura que permite que nossos clientes utilizem essa solução dentro do próprio ecossistema. Diferentemente dos incumbentes, não apenas fornecemos o crédito, mas também viabilizamos sua utilização direta em um ambiente onde os participantes – parceiros, clientes e fornecedores – já são conhecidos. Isso aumenta a assertividade na concessão, pois a análise considera um contexto transacional mais rico e confiável, reduzindo riscos e ampliando o acesso ao parcelamento para públicos que, pelos critérios convencionais, teriam dificuldades em obter crédito.
Novo Varejo – Essas soluções já estão disponíveis para os varejistas de todos os portes? Como você vê o atual cenário das taxas de transação envolvidas neste cenário?
Thiago Zaninotti – As soluções de Pix Parcelado já estão chegando ao mercado para varejistas de diferentes portes, mas ainda estamos no início desta jornada. Observamos uma adoção inicial por médios e grandes lojistas, com expansão gradual para os pequenos negócios conforme a tecnologia amadurece. As taxas de transação tendem a ser significativamente menores que as praticadas no cartão de crédito tradicional. O diferencial está na estrutura de custos: como o Pix tem uma infraestrutura mais eficiente e gerida pelo Banco Central, os custos operacionais são reduzidos, permitindo taxas mais competitivas.
Novo Varejo – Como garantir que este novo mecanismo seja seguro tanto para os consumidores quanto para os varejistas?
Thiago Zaninotti – A segurança do Pix por aproximação depende de múltiplas camadas de proteção. Para os consumidores, recomendamos ativar todas as configurações de segurança disponíveis nas carteiras digitais, incluindo PIN e biometria para autorizar transações. É fundamental também configurar limites diários e por transação. Para os varejistas, os sistemas de pagamento devem implementar verificações adicionais em transações de maior valor. O Banco Central vem aprimorando constantemente os mecanismos de segurança, como o Mecanismo Especial de Devolução, que facilita o estorno em casos suspeitos. A combinação de tecnologia segura com práticas conscientes de uso minimiza significativamente os riscos tanto para consumidores quanto para estabelecimentos.