O comércio internacional vem sendo tema central da pauta econômica nas últimas semanas. Os temores que envolvem as balanças comerciais globais têm um catalisador em comum: Donald Trump. No Novo Varejo digital 455 vimos os impactos da política tresloucada de taxações propostas pelo presidente dos Estados Unidos sob o viés do Aftermarket Automotivo local. Mas, é claro, a questão tem abrangência infinitamente maior do que quando vista a partir de um prisma meramente setorial. Há especialistas que acreditam que as regras do comércio global correm o risco de voltar ao período pré-Segunda Guerra! O empoderamento de Elon Musk na gestão estratégica da maior economia do mundo – e a mais ‘importadora – também não ajuda muito a garantir estabilidade.
Decisões guiadas pelo fígado em detrimento ao cérebro via de regra não levam a um bom caminho. Desde a primeira metade da década de 1990, o fenômeno da globalização vem ditando regras do comércio internacional. A OMC – Organização Mundial do Comércio foi criada neste período e hoje se vê esvaziada pelo protecionismo do presidente norte-americano. Em entrevista à CNN Brasil, o coordenador do Centro de Negócios Globais da FGV, Lucas Ferraz, avaliou que os planos de tarifação anunciados por Trump são disruptivos e preocupantes para os países em desenvolvimento. Para o especialista, o risco de “desmantelamento de fato das regras do sistema multilateral de comércio” é real. A conjuntura traz de volta o desastroso processo de desindustrialização enfrentado pelo Brasil há décadas, que necessariamente aumenta nossa dependência das importações. Se tornou uma questão de sobrevivência para muitas marcas – de diferentes setores, inclusive autopeças – trazer produtos de fora para embalar aqui. Mas, do ponto de vista de nação, é algo a se lamentar. Nas últimas quatro décadas, despencou de 33% para 15% a participação da indústria de transformação no PIB brasileiro. Não nos iludamos: um dia, a conta vai chegar. Será que é agora? Segundo dados divulgados pela CNI – Confederação Nacional da Indústria em sua análise conjuntural 2024/2025, parte significativa do aumento da demanda interna vem sendo atendida por importações. “O volume importado acumulado de janeiro a novembro de 2024 cresceu 26,0% para bens de capital, 23,2% para bens de consumo e 18,6% para bens intermediários, na comparação com o mesmo período de 2023”. Daí resulta uma equação interessante: a dependência cresce na medida em que as estruturas do comércio internacional podem vir a sofrer abalos verdadeiramente sísmicos.
Neste contexto, o Relatório da Balança Comercial divulgado em fevereiro pelo Sindipeças começa dizendo que as primeiras medidas anunciadas após a posse de Trump sinalizam que os riscos devem se intensificar. “Embora ameaças concretas despontem no horizonte, seria leviano ignorar que oportunidades vão surgir surgirão. A leitura correta do momento e de seus desdobramentos serão essenciais para que as nações operem suas relações comerciais com relativo êxito nos próximos anos”. Eis aí o grande desafio. Ao que tudo indica, muitas emoções nos esperam. Em tempo: o déficit da balança comercial brasileira de autopeças cresceu nada menos que 33,8% em janeiro de 2025 na comparação com o mesmo mês do ano passado…