Eu sou do tempo em que ‘burnout’ era sentar-se ao volante de um Dodge Charger R/T, um Maverick GT, ou qualquer outro V8 de tração traseira que estivesse à mão, e despejar potência nas rodas para lixar os pneus no asfalto sem misericórdia e levantar o máximo possível de fumaça branca no meio ambiente. Admito que não é o jeito mais politicamente correto de iniciar um texto, mas fazer o quê?
Houve uma época em que a vida era mais ou menos assim. Pra mim, saudosismo e nostalgia sempre serão virtudes. Mas, avancemos no tempo até o mundo real. Hoje, quando se fala em ‘burnout’ nem todos se lembram de automóveis. O que um dia esteve relacionado a um certo grau de diversão, agora é imediatamente associado a doença. Se você digitar no Google “o que é burnout”, imediatamente encontrará: “A síndrome de burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento profissional, é um distúrbio psíquico caracterizado por exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal no trabaho. Ela é causada pela exaustão extrema relacionada ao trabalho e pode afetar quase todas as facetas da vida de um indivíduo.
Os sintomas incluem estresse extremo, cansaço, desmotivação e incapacidade de lidar com as demandas diárias. É importante buscar tratamento e apoio para lidar com essa condição”. Vivemos uma era em que a capacidade humana de suportar a pressão é levada ao limite. A sobrecarga de informações a que somos submetidos diariamente muitas vezes se torna absurdamente opressiva. O fluxo ocorre em tempo real. A evolução tecnológica trouxe incontáveis benefícios a praticidades para nosso dia a dia, mas também abriu as portas do inferno para a circulação de desinformação e violência retórica em altíssima velocidade. Da maneira mais dolorida, muitas vezes nos deparamos com uma parcela assustadora da sociedade em que vivemos, que no passado estava restrita a um pequeno círculo de relacionamentos, mas que agora tem alcance global.
O mundo que habitamos hoje é, verdadeiramente, estressante. E, de forma inevitável, essa conjuntura acaba refletindo também no trabalho de cada um de nós. As 24 horas de nossos dias parecem não ser mais suficientes para dar conta das crescentes exigências que a rotina nos traz. O ser humano vive sob pressão por eficiência e resultados, cercado por câmeras a cada passo que dá – o Big Brother criado pelo escritor Geroge Orwell no livro ‘1984’ cada vez mais parece deixar a literatura e assumir formas físicas. A reportagem de capa desta edição traz um panorama da situação dos profissionais do varejo e a necessária futura adequação do setor a uma nova norma do Ministério do Trabalho que pretende reduzir o esgotamento das pessoas nos ambientes de trabalho.
O Brasil ainda é um país que sofre com a baixa produtividade e isso precisa mudar para tornar nossa economia mais competitiva nas relações do comércio global. A reversão desse quadro deve contemplar também a qualidade de vida em todos os níveis hierárquicos das empresas. Sem saúde e motivação não há bons resultados possíveis.